sábado, 12 de março de 2011

2502) A bazuca (12.3.2011)



Chegou-me pelo Correio um formulário impresso, pedindo-me para ir retirar a encomenda na agência, munido de um documento de identidade. 

Fui lá, entreguei o papel no balcão, o cara entrou, demorou e daí a pouco voltaram ele e outro puxando uma espécie de caixote comprido, com dois metros de altura, que parecia conter um poste de luz. Conferi o endereço: era mesmo para mim. Conferi o remetente: uma sigla incompreensível, com endereço numa cidade obscura, nos Estados Unidos. Como tenho amigos músicos por lá, pensei que se tratasse, sei lá, de algum instrumento, um rack de CDs... Mas, pra mim?! Cara de perplexidade. 

Com a ajuda dos funcionários do Correio levei a estrovenga até a rua, consegui enfiá-la dentro de um táxi e voltei para casa. Abri o caixote na sala e me deparei com a bazuca. 

Claro que soube logo do que se tratava, vejo filmes de guerra desde garoto, já vi centenas de vezes o sujeito pegando aquele cano largo e comprido, apoiando-o no ombro, agarrando a empunhadura, fechando o olho esquerdo para fazer mira, apertando o gatilho e disparando aquele morteiro mortífero que faz uma trajetória chispante pelo espaço e vai explodir em chamas lá na frente, a algumas dezenas de metros. 

Que era uma bazuca, não havia a menor dúvida; vinha inclusive com meia dúzia de projéteis, acondicionados de forma engenhosa nos espaços vazios da embalagem. Mas, quem a mandou? E por que para mim? 

Procurei no Google, sem sucesso, pistas que me levassem ao remetente: a cidadezinha alegada (Junction, em Nebraska) não existia. Havia um manual de instruções explicando como finalizar a montagem (alguma peças essenciais, por precaução, vinham um saco plástico).  Montei o parangolé, só por curiosidade. Deixei-a na sala, pronta para o uso, já com um morteiro na agulha. 

Isto já faz um mês e começo a me impacientar. Nada no mundo acontece de graça, não é mesmo? Se alguém me mandou uma coisa tão cara e trabalhosa, foi com alguma intenção. Se mandou para mim, ou é porque me conhece, ou porque acha que sou alguém que pode fazer bom uso. O instrumento é de excelente qualidade, novinho em folha. Não usá-lo seria, por um lado, um desperdício de dinheiro e de trabalho industrial; por outro, o desperdício da chance de uma nova experiência. 

Sou daquele tipo de sujeito que não vive à procura de oportunidades, mas que também não as recusa quando elas lhe caem no colo. Nada acontece de graça. 

Da minha janela, tenho uma paisagem variada. Uma quadra cimentada onde crianças brincam. Um campinho de pelada onde sujeito grisalhos e barrigudos jogam futebol. Um boteco sempre rodeado de mesas e cadeiras de plástico, com rodas de samba, etc. Ruas de trânsito intenso. Apartamentos que se iluminam à noite, cheios de gente atarefada e desconhecida. 

Nada acontece de graça. Se isso veio parar nas minhas mãos é por algum motivo, e alguma coisa me diz que o acesso à resposta está no dedo indicador de minha mão direita.