domingo, 21 de outubro de 2012

3009) "A Volta do Parafuso" (21.10.2012)





Esta noveleta de Henry James (1898) é um clássico da literatura de terror, e teve uma ótima adaptação para o cinema (Os Inocentes, Jack Clayton, 1961 – aqui, uma boa e informativa crítica de Colm Tóibín: http://bit.ly/SXIoxz). É a história de uma governanta que vai cuidar de um casal de crianças (10 e 8 anos) numa mansão assombrada pelos fantasmas de um casal de criados que, quando vivos, estavam fazendo tudo para perverter o garoto e a garota. A governanta vê os fantasmas; as crianças parecem não vê-los, e tudo conduz a um desfecho trágico.

Já correu um Açude Velho de tinta a respeito desse livro, que é um dos grandes exemplos do que a gente chama “o fantástico todoroviano”. A teoria de Tzvetan Todorov é de que uma história legitimamente fantástica é aquela que permite o tempo inteiro duas leituras: uma leitura sobrenatural (os fantasmas existem de fato) e uma leitura realista (tudo não passa de um delírio provocado pela sexualidade reprimida da governanta). As duas leituras estão entrelaçadas, e qualquer pessoa que queira defender uma delas encontrará numerosas pistas ao longo do texto.

Um aspecto que se discute menos sobre esta pequena grande história é que James foi um dos primeiros e melhores formuladores da teoria que hoje chamamos “Não Mostrar o Monstro”. Quando queremos assustar o leitor, é melhor a abordagem indireta, que sugere mas não afirma, implica mas não descreve, deixa tudo à imaginação do próprio leitor. Amigo de Robert Louis Stevenson, James talvez tivesse em mente, ao escrever, o clássico Dr. Jekyll e Mr. Hyde que o amigo publicara em 1886, e onde a natureza exata das perversidades de Mr. Hyde não fica bem clara.

Diz James, no prefácio à edição de Nova York de A Volta do Parafuso: “Já vimos, em ficção, uma forma magnífica de malfeito ou, melhor ainda, de mau comportamento, atribuída, vemo-la prometida e anunciada como se fosse pelo bafo quente do Abismo – e então, lamentavelmente, reduzida ao âmbito de alguma brutalidade específica, uma imoralidade específica, uma infâmia específica retratada. (...) [Para evitar isto,] basta tornar bastante intensa a visão geral que o leitor tem do mal, calculei – e essa já é uma tarefa charmosa – e sua própria experiência, sua própria imaginação, sua própria compaixão (pelas crianças) e horror (dos falsos amigos delas) lhe fornecerão, de forma satisfatória, todos os pormenores. Faça-o pensar no mal, faça-o pensar por si, e você estará livre das frágeis especificidades”. O que é induzido e sugerido se multiplica em um milhão de fantasias de horror nas mentes de um milhão de leitores. E cada horror será personalizado.