Todorov reconhecia dois extremos numa escala das
narrativas do sobrenatural. Num extremo, o Maravilhoso: histórias totalmente
irreais, imaginárias, sem vínculo com nossa realidade. No outro, o Estranho,
histórias que têm algo de insólito ou extraordinário, mas no final admitem uma
explicação realista, não-sobrenatural. O Fantástico (para ele) seria uma
oscilação intermediária, histórias onde o personagem, ou o autor, ou o leitor,
ou os três, não conseguem decidir se os fatos narrados são de fato
sobrenaturais (o que levaria a história para o terreno do Maravilhoso) ou têm
explicação realista (o que a levaria na direção do Estranho).
O livro original de Todorov é de 1970. Duvido que ele não
conhecesse então a famosa Antologia da Literatura Fantástica de Borges, Bioy
Casares e Silvina Ocampo (São Paulo: Cosac Naify, 2013, tradução de Josely
Vianna Baptista). No prólogo (a antologia é de 1940) diz Bioy Casares:
“Os contos fantásticos podem ser classificados, também,
pela explicação: a) os que se explicam pela ação de um ser ou de um fato sobrenatural;
b) os que têm explicação fantástica, mas não sobrenatural (“científica” não me
parece o adjetivo conveniente para essas invenções rigorosas, verossímeis, à
força de sintaxe); c) os que se explicam pela intervenção de um ser ou de um
fato sobrenatural mas insinuam, também, a possibilidade de uma explicação
natural (“Sredni Vashtar”, de Saki); os que admitem uma alucinação explicativa.
Essa possibilidade de explicações naturais pode ser um acerto, uma complexidade
maior; geralmente é uma fraqueza, um subterfúgio do autor, que não soube propor
o fantástico com verossimilhança.”