H. P. Lovecraft foi um dos escritores mais heterodoxos do seu tempo, uma figura fascinante. Um tímido de meia idade, escrevendo cartas quilométricas para jovens que em muitos casos nunca chegou a conhecer. Um cético materialista que escrevia sobre terror sobrenatural. Um aristocrata de espírito que passou toda a vida adulta na penúria. Seus contos que misturam terror e ficção científica, e seu ensaio O Horror Sobrenatural na Literatura, uma descrição comentada de dois séculos de narrativas de horror, são textos fundadores do gênero.
Como leitor, Lovecraft não economizava opiniões ao escrever
para os amigos. Numa carta para Clark Ashton Smith (em 1926), ele diz: “A
respeito de romantismo e de fantasia, eu, por mim, desdenho o primeiro, a não
ser sob a forma do segundo.” [HPL se refere a “romantismo”, não como “histórias
de amor”, mas como a literatura na linha de Byron, Shelley, Victor Hugo.] “Para mim,” continua ele, existe algo de
não-vital na supercolorida representação do que se pretende ser a vida real – o
sentimentalismo de Dickens, os heróis bombásticos de Dumas, ou Victor Hugo no
que tem de mais lamuriento. Para mim existe algo de pueril em delinear uma
espécie de variante da vida, cheia de convenções, com pensamentos e sentimentos
espúrios e artificiais, e depois ficar todo piegas e excitado e efusivo a
respeito dela. Mas a fantasia é algo totalmente diferente. Aqui, temos uma arte
baseada na vida imaginativa da mente humana, francamente reconhecida como tal;
e, ao seu modo, tão natural e científica – tão relacionada aos processos
psicológicos naturais (ainda que incomuns, delicados) quanto o mais nítido dos
realismos fotográficos.”
Lovecraft não desdenha o realismo, apenas acha que a
fantasia o expande e engrandece. Alimentada dos recursos do realismo, ela se
torna grandiosa. Ele diz: “[Lord] Dunsany escreve – e você [C. A. Smith] tanto
escreve quanto pinta – o épico autêntico de uma região etérea, tão bem
fundamentada e bem descrita quanto o mundo real dos seres; e porque você não
finge que aquilo é o mundo real, mas reconhece nele um mundo de fantasia, sua
arte tem uma verdade e uma dignidade e um lugar mais elevado na estética, lugar
que (na minha opinião) o romance sentimental terrestre não tem.”