terça-feira, 25 de agosto de 2009

1220) Os reféns do robô (9.2.2007)




Raul Seixas dizia, numa canção famosa, que o ser humano só usa dez por cento de sua cabeça animal. Não sei se é verdade científica, mas o fato é que quando ele disse isto todo mundo acreditou na mesma hora. Por que? Porque sentimos, intuitivamente, que é verdade. Sabemos que durante a maior parte do nosso tempo estamos sub-utilizando nossos neurônios. 

Vivemos numa espécie de sonambulismo lúcido, que nos permite conversar, sair de casa, trabalhar, comer, ir ao cinema, usando apenas um mínimo da inteligência de que dispomos. Um enorme desperdício – mas é tão cômodo, e nós somos tão preguiçosos... Não custa nada viver assim. Dá menos trabalho.

Os cientistas têm utilizado a ressonância magnética para mapear o que acontece no cérebro das pessoas quando estão executando tarefas e quando estão simplesmente descansando entre uma tarefa e outra. Voluntários recebem cálculos mentais, ou tarefas de memorização, e o resultado da ressonância mostra certas áreas do cérebro intensamente envolvidas. 

Nos intervalos, quando são deixados a sós, mas ainda sob monitoração, outras áreas, as mesmas em cada indivíduo, assumem o comando. Depois, todos confessam que estavam “pensando bobagem” ou devaneando.

Colin Wilson é um dos ensaístas que mais se desesperam com este estado de coisas. Ele compara nossa mente consciente a um robô, a um piloto automático, e analisa (em O Oculto, ed. Francisco Alves) a obra de Gurdjieff, pensador russo que para uns era um mago, para outros um charlatão, mas que parece ter compreendido como ninguém certos segredos do funcionamento de nossa mente. 

Para Gurdjieff, o que chamamos de consciência não passa de um devaneio constante. Nossa mente só desperta de verdade quando algo urgente nos ocorre, ou quando experimentamos um estímulo mental muito poderoso (uma música, um texto, etc.). 

Nesses momentos, mente e corpo acendem todas as suas luzes, passam a trabalhar a todo vapor. Somos invadidos por uma energia que não sabemos de onde surgiu; nossa percepção sensorial se torna aguda e nítida, nossa mente parece raciocinar a uma velocidade espantosa.

Perguntam Gurdjieff e Wilson: não poderia ser assim o tempo todo? Por que nos resignamos a esta vida mecânica, repetitiva, em que achamos que estamos “acordados” simplesmente porque estamos andando na rua e conversando com outras pessoas, mas na verdade estamos num estado meio sonambúlico? 

Psicólogos e neurologistas têm confirmado estas opiniões de Gurdjieff. Para eles, passamos a maior parte do tempo reféns do robô, entretidos em devaneios sem rumo, recordando fatos recentes ou planejando coisas: um trabalho, uma conversa com alguém. Tudo isto exige apenas um mínimo de esforço mental, e é algo que brota espontaneamente em nosso cérebro quando ele não está sendo exigido para nada urgente, mais ou menos como um “screen saver”, ou protetor de tela, toma conta do monitor de nosso computador se ele passar algum tempo sem ser utilizado.






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