terça-feira, 25 de agosto de 2009

1218) A ética dos descrentes (7.2.2007)




O que pensadores religiosos de hoje questionam (como no livro Em que crêem os que não crêem, de Umberto Eco e Carlo Martini) é a dificuldade de estabelecer valores universais fundados na mera experiência humana. 

Ciência e Religião têm, entre tantas coisas em comum, a busca pelo Absoluto. A exigência de um ponto de referência inquestionável, que servisse de referência para todos os outros valores, foi, ali pelo século 17, um paradigma comum à ciência e à religião. 

Monoteísmo e física newtoniana têm um perfil muito semelhante. Existe um Centro. Existe um valor fixo, arbitrariamente estabelecido pela fé científica ou pela fé religiosa.

Quando Einstein estilhaçou o conceito físico do tempo absoluto, espaço absoluto, e todo o resto, criou um vácuo a mais entre ciência e religião. 

A física de hoje não reconhece o Absoluto, reconhece apenas “constantes”, certas grandezas inexplicáveis e inevitáveis na Natureza (a velocidade da luz, a massa do elétron, etc.). 

Essas constantes, cujo valor matemático precisa sempre ser levado em conta, são as vigas fundamentais da Natureza; todo o resto muda, elas não. São o que a Ciência de hoje tem de mais parecido com o antigo senso do Absoluto.

Ecos da mentalidade monoteísta ainda permanecem. A Teoria do Big Bang, segundo a qual o Universo estava todo concentrado num ponto, o qual explodiu, dando origem às atuais galáxias, exprime essa necessidade básica do pensamento monoteísta: a de que a Realidade tem um Centro, e pode ser visualizada como um círculo ou uma esfera. 

Quem acredita no Absoluto tem, quase sempre, uma visão geométrica das coisas. Seu Absoluto geralmente é regido por algum tipo de simetria. Círculo e esfera são formas básicas, intuitivamente atrativas; mas nada nos garante que o Universo não tem a forma, por exemplo, de uma folha de papel pautado ou de uma ampulheta.

Cosmologia à parte, esta necessidade de um Centro se dá também no plano moral. Mesmo quando julgamos as ações humanas tendo em conta que “cada caso é um caso”, essas avaliações não podem partir do zero. 

Os pensadores laicos, que não crêem no Absoluto metafísico, tentam colocar em seu lugar algumas constantes humanas de comportamento e de moral, às quais possam se apegar para elaborar leis e códigos. 

Não se pode reinventar a Ética, a Moral e o Direito a cada novo problema que surge, mas podem-se empregar constantes que não sejam mutuamente contraditórias. Verdades que se apóiam como aqueles muros onde as pedras não são unidas por argamassa, mas se fixam umas às outras devido ao peso de cada uma.

É possível criar uma Moral sem Deus, assim como já foi possível ter um Deus e atribuir-lhe uma Moral sanguinária ou colonialista (como no tempo em que, para a Igreja, os índios da América não tinham alma, e podiam ser mortos impunemente). 

As “constantes” morais dos não-cristãos refletem a sociedade que as cria. O teste de sua validade é o que acontece com a sociedade que as adota.






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