domingo, 1 de março de 2009

0858) Superstições da informática (16.12.2005)



Dizem os sociólogos que o advento da tecnologia extingue o misticismo, o animismo, a superstição. Pois eu acho o contrário. O misticismo e seus correlatos funcionam como uma enorme jângal amazônica, e cada tecnologia nova que é deixada no meio dela acaba sendo absorvida sem muitos problemas digestivos. O exemplo clássico disto é a pegada que o astronauta Neil Armstrong deixou na areia da Lua ao pisar nela pela primeira vez. Armstrong desceu a escada do módulo lunar de forma a pisar na Lua com o pé direito. Seguro morreu de velho.

A convivência com os computadores tem me sugerido algumas superstições novas, que nada têm a ver com gato preto ou espelho quebrado. Comecei a acreditar em aura, por exemplo. Não se trata de uma aura espiritual (embora, na minha idade, a prudência me aconselhe a não descartar hipótese alguma), mas de uma aura eletromagnética emitida por meu corpo e essencial ao funcionamento do PC. A prova disto está em que, todas as vezes que clico ou digito um comando e me afasto para ir buscar café ou atender o telefone, na volta encontro na tela uma mensagem de erro. Percebi que, abandonado aos seus próprios recursos, computador cai mais do que teco-teco. Por quê? Porque os seus circuitos acostumaram-se a trabalhar com uma determinada intensidade de campo energético, que é a soma do dele próprio com o meu. Quando me afasto... queda de voltagem, e ele não consegue arremeter sozinho.

Comecei a acreditar também numa coisa que antes me parecia pertencer apenas ao domínio da ficção científica: a memória individual das máquinas. Creio firmemente que os computadores, como os gatos e os cachorros, acabam se amoldando aos seus donos, aprendendo seus hábitos, adaptando-se a eles. Toda vez que uma pessoa estranha vem à minha casa e precisa usar meu PC, alguma coisa errada acontece. Ele trava, ou fica inexplicavelmente lento, ou manda tela-azul a cada tentativa. É sabido que cada pessoa tem seus próprios caminhos para abrir e usar os programas, e os computadores se acostumam com o estilo de cada qual. Eu, por exemplo, assim que ligo o PC abro o Windows Explorer, cuja árvore de pastas e arquivos é meu guia indispensável. Me formei na época do DOS e do X-Tree Gold, e só sei caminhar por entre meus milhares de arquivos (texto, som, imagem) usando estes utilíssimos índices. Quando alguém chega e quer abrir um arquivo usando outro sistema, a máquina pula, corcoveia, refuga, sacode-se toda até expelir o peão intruso que ousou acessar-lhe a sela.

As máquinas estão vivas. O escritor de FC Fábio Fernandes ganhou dos amigos o apelido de “Cybergeist” (Poltergeist Cibernético), porque bastava-lhe botar a mão num PC para que alguma catástrofe lhe sucedesse. Já lhe ocorreu perder um arquivo de forma tão radical que até o disquete de backup que guardava noutro cômodo da casa foi reformatado. Supersticioso, eu? Não, amigos. Preparem-se para o mundo do futuro, a Era dos Ciber-Simbiontes.

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