Ele estava passando uns dias naquele lugar, a serviço. Era uma cidade pequena mas tinha cinema, tinha um teatro com cartazes anunciando show musicais, e tinha um parque de diversões. Chamar aquilo disso era força de expressão. Tudo bastante precário. Brinquedos enormes, mas muito velhos e desgastados. Na segunda noite ele entrou, pensando somente em fazer algumas fotos com o celular, porque havia uns cartazes e uns ângulos interessantes. Comprou ingresso aqui, cerveja ali, puxou conversa. Na bilheteria viu a morena, a quem chamou brincando de Luluza, ao recolher o troco, e ouviu dela uma resposta que o fez dar uma gargalhada e olhar naqueles olhos pela primeira vez.
Voltou na noite seguinte (o trabalho o ocupava das dez até o
anoitecer) e retomou o papo com ela numa brecha entre o fim de uma fila e o
começo da próxima. Perguntou: “Parquezinho esquisito, hem? Por que não botam luzes coloridas, como todo
mundo?” Ela de olhos baixos, arrumando notas por ordem de valor: “O dono gosta
assim. Tudo preto e branco.” Ele falou:
“Que coisa, hem. E você? Gosta mais de preto e branco ou de colorido?” Para ele era só um puxa-conversa pra não
deixar a peteca cair, manter o timing da simpatia. Teria pegado mal para
ela? Que disse: “Eu danço conforme a
música, amorzinho,”. Plantou as mãos na bancada, ergueu os olhos para ele, e
abriu um sorriso dentifrício. “Eu sou a esposa dele, e danço a música que ele
tocar.” “Oooops,” disse ele, gargalhando, “não se ofenda. Não estou achando
feio. Torna-se até uma coisa bastante cult.”
Foi quando ele viu o homem descer da roda gigante, e entrar
cambaleando num pequeno chalé de madeira ali perto, passando a menos de cinco
metros da bilheteria onde estavam. “Lá vai ele,” disse ela. E depois: “Deixou
de beber. Agora ele dá uma volta na roda, desce tonto, e escreve.” “Escreve o
que?” “Romance. Vai dizer que nunca
ouviu falar de...” Ele anotou o nome, soletradamente. “E como deixaram ele
fazer a cabana dele aqui dentro?”, perguntou, e ela: “Ele é o dono do parque.
Ninguém vive de literatura neste país. Quando sobrevive, pode pegar uma cerva e
comemorar.” Ele entendeu “uma serva”, gargalhou, fez sinal de positivo, legal.
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