(ilustração: Supranav Dash)
A mulher loura atravessa o banheiro envolta numa toalha
azul-turmalina. Um texto em itálico
começa a correr horizontalmente na tela, à altura das legendas: “Quando a
humanidade inteira pareceu ter enlouquecido e o mundo começou a se acabar, ela
conheceu o seu primeiro tempo de paz, o primeiro oásis de sua vida”. Imagens da cidade, um porto nórdico ou
eslavo, com longos armazéns de peixe se enfileirando no cais do porto. Uma voz de policial, fatigado de tantas
horas-extras:
“Há mais de meio século esta cidade agarra-se à vida, quando
já devia ter virado cidade fantasma. Foi
sendo engolida por portos maiores e evitada pelas rotas comerciais mais
rentáveis. Não morreu porque três ou
quatro quadrilhas étnicas dominam sua economia e seus três poderes. Jogo, contrabando, cabarés, drogas aqui e
ali, armas aqui e ali, mas de um modo geral, por ser uma cidade turística, é
uma criminalidade do lazer e do prazer, onde a violência só acontece quando
necessária.”
A câmera avança por um corredor, um braço percute numa porta
com os nós dos dedos. A textura dessa
imagem é meio quadrinhos, meio videogame de muitos polígonos. A mulher que abre a porta, no entanto, é de
uma perfeição digital onde é possível reconhecer cada poro do seu rosto e
dar-lhe um nome e um apelido. Ela diz ao
doutor que ele é muito bem vindo, e é uma honra receber uma visita tão ilustre. Ela está visivelmente nervosa. O cenário ao fundo continua poligonal. Sentam-se os dois na sala de visitas, diante
de uma mesinha de chá, com bule, xícaras, etc.
Ela tem as mãos pousadas no colo.
Ele usa terno e tem a cabeça de um abutre, com o bico bem aberto.
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