Caminhando devagar, o homem de blusão negro chegou à esquina de uma ruazinha estreita, calçada de pedras, iluminada por um poste. Casas estreitas se sucediam, como livros numa estante. Na luz arroxeada do anoitecer, janelas projetavam retângulos amarelos até a calçada oposta. Algumas crianças brincavam em torno de um carro estacionado. Diante do batente de uma casa de janelas fechadas, um velho de pijama cochilava com a cabeça abaixada, numa cadeira de balanço. O homem tirou do bolso um papelzinho, enquanto caminhava, e conferiu o número que tinha anotado.
Bateu
à porta, pediu para ver o dono da casa. Uma criada de roupa amarfanhada o fez
entrar e pediu-lhe que esperasse. A sala tinha um cheiro úmido como se há muito
tempo as janelas não fossem abertas para o vento e o sol. Farelos de comida
pelo chão indicavam que não tinha sido varrida na véspera. Ele sentou no sofá,
que cedeu mais do que era de se esperar. A parede onde estava encostado o sofá
vibrava: no quarto contíguo havia uma TV ligada, bradando o ruído irritante de
um filme de mercenários em guerra.
Há
dez anos ele tentava localizar aquele homem. Viajou o país inteiro, remexeu
arquivos, consultou cartórios, rastreou os indícios de sua passagem. Uma pista
o trouxe àquela cidade de um milhão de habitantes, onde parecia fácil
desaparecer. Era fácil esconder-se ali,
dissolver-se para sempre num subúrbio, numa ruazinha remota, cercado por gente
que não dava atenção a nada. De posse do
endereço anotado, ele voltou ao hotel, almoçou, deu alguns telefonemas, e ao
anoitecer pegou o ônibus que o trouxera ali.
“Quem
lhe deu meu endereço me ligou em seguida,” disse a voz à janela, sobressaltando-o.
Olhou: era o velhinho que estivera cochilando na calçada, e o revólver em sua
mão não tremia. “Não pense que me caçou. Fui eu que o pesquei.”
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