terça-feira, 8 de junho de 2010

2118) A casa, a escola e a rua (22.12.2009)



(grafitos de Vitche e Flip)

São nossos três palcos de aprendizado, os três ambientes onde nos ensinam o básico (ou seja, nos ensinam a aprender e a utilizar o aprendido) e depois nos mandam às feras. Cada um desses ambientes tem primazia em diferentes épocas da nossa vida. A primeira infância pertence toda à Casa. Os pais e a família concêntrica passam pro bebê as primeiras noções de qualquer coisa, num processo que muitas vezes vai até a vida adulta. O rapaz ou a moça que sai da casa paterna (geralmente para casar) aos vinte e tantos anos de idade está partindo um cordão umbilical que é real, não tem nada de simbólico. É um cordão psicológico, mas tão real que tem gente que não consegue parti-lo nunca.

A Escola começa quando chega a hora do pirralho ser enviado para seu primeiro jardim-de-infância, onde começa a ser deixado sozinho (longe dos pais), a bater de frente com outros pirralhos que estão passando pelo mesmo susto e desmame, e a ter lições formais num ambiente formal. Escola tem sempre uma conotação chata. Nossos filhos sempre perguntam, principalmente dos 12 anos em diante: “Mas pra quê que eu tenho que estudar essas coisas? Pra que é que eu vou precisar disso?” Não sei, e até a idade em que estou não precisei extrair nenhuma raiz quadrada ou cúbica, não precisei saber quem eram os membros da Regência Trina Provisória, nem alguém jamais me perguntou quais eram os elementos químicos monovalentes, bivalentes ou trivalentes. Mas respondo: “Estudar essas coisas ensina disciplina de estudo, não ensina as coisas em si. Ensina você a enfiar a cara num livro e aprender alguma coisa, e vai precisar disso um dia, quando se defrontar com coisas que lhe interessam mas que exigem esforço para serem assimiladas”.

E finalmente vem a Rua. Essa está sempre presente, de um modo ou de outro, mas é a partir da adolescência que ela rapidamente bota as outras duas no bolso e impõe ao garoto ou à garota suas leis inescapáveis. O mais danado da rua é que ela é sedutora de um modo que Casa e Escola nunca são. Ou talvez devêssemos reconhecer que a Rua parece ter as respostas para as perguntas que os hormônios ficam fazendo 24 horas por dia, 60 segundos por minuto, dentro dos metabolismos turbilhonantes dos nossos filhos. É fácil dizer que essas respostas são o sexo, as drogas e o rock-and-roll. Pelo que me lembro, de quando passei por essa encarnação, o que a rua tinha de mais fascinante era a solidão. O fato de eu saber que ali estava entregue a minhas próprias forças e espertezas, e que na hora de um problema não poderia contar com meus pais, nem com o surrado recurso de “ir me queixar na Secretaria do Colégio”. A Rua é fascinante porque é o nosso destino final. Quando chegamos nela, nunca mais saímos. É para viver na Rua que Casa e Escola nos preparam, é para atuar na Rua que estávamos estudando não importa o quê (frações, pronomes, Tordesilhas, co-senos), porque as perguntas que a Rua nos fará nunca são as que esperávamos.

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