segunda-feira, 1 de março de 2010

1729) Simetrias secretas (26.9.2008)




(Clennon e Dysart)

Há coisas que só um cinéfilo muito do desocupado percebe. Podem não ter e provavelmente não têm importância alguma: mas são simetrias secretas. 

É como encontrar duas árvores exatamente iguais. Qual a probabilidade disto acontecer? O mundo é cheio de rimas, escritas não sei por quem.

Ontem assisti na TV Muito Além do Jardim (Being There, 1979), de Hal Ashby. Nele, Peter Sellers faz o papel de um jardineiro retardado. Por uma série de acasos, ele é recolhido como hóspede na casa de um bilionário, em Washington, e acaba se transformando em conselheiro do Presidente dos EUA e sendo cotado para sucedê-lo.

É uma sátira excelente, e foi o último filme de Sellers, que concorreu ao Oscar, e morreu um ano depois.

Dois coadjuvantes tinham rostos que me pareceram familiares, e fui ver quem eram. Eram David Clennon, que faz um advogado, e Richard Dysart, que faz o médico particular do bilionário (Melvyn Douglas).

Fui no Internet Movie Data Base, e descobri uma coisa curiosa. Depois desse filme os dois trabalharam também em O Enigma do Outro Mundo (The Thing, 1982) de John Carpenter, como dois dos cientistas que, numa base na Antártica, combatem um alienígena.

O mais estranho é que esses dois atores fizeram papéis parecidos em dois filmes parecidos.

Em Muito Além do Jardim eles são os únicos personagens que não acreditam que Chauncey (Peter Sellers) seja de fato o gentleman intelectual e “zen” que todos (inclusive o Presidente dos EUA) imaginam. Eles sabem que Chauncey é vazio, é uma mente “em branco”, que está ali representando um papel sem nem saber que o faz, de tão vácuo que é. Ele impersonou involuntariamente um tipo humano, e todo mundo comeu corda. Todo mundo olha para Chauncey, e vê nele uma pessoa que ele não é.

Em O Enigma do Outro Mundo, os cientistas na base da Antártica descobrem uma nave enterrada, e um alienígena perigosíssimo que é um “shape-changer”, uma criatura que “muda de forma”, capaz de absorver partes de qualquer outra criatura, sintetizar seu DNA, e, de forma quase instantânea, se metamorfosear, adquirindo a aparência daquela criatura.

O monstro vai devorando os cientistas um por um (inclusive os interpretados por Clennon e Dysart), e o suspense da história é não sabermos, quando Fulano aparece, se Fulano é ele mesmo ou já é o monstro.

Há um conto de FC de Bob Shaw (“Reprise”, 1970) em que uma nave extraterrestre se acidenta perto de uma vila inglesa. O único sobrevivente, um “shape-changer”, se refugia num cinema e, para passar despercebido, adota a aparência de algum dos atores coadjuvantes do filme que está passando naquela noite. É descoberto por um cinéfilo que acha estranho ver na platéia, toda noite, um coadjuvante do filme que acabou de passar, alguns deles mortos há muitos anos...

Acho que existem criaturas, entre nós, que não são o que parecem, que adquiriram um poder desmedido em nosso mundo, e usam estes filmes para revelarem aos poucos sua presença e nos anunciarem seu Reino.





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