domingo, 5 de julho de 2009

1144) A nova “Rolling Stone”(12.11.2006)




Mudaria a Rolling Stone ou mudei eu? A revista que já foi chamada a “Bíblia do Rock” retorna em nova versão brasileira, depois da versão dos anos 1970 que os roqueiros paleozóicos como eu recordam com tanto carinho. Mas... os tempos estão a-mudando? Quem sai na capa do número 1 é Giselle Bundchen! Me desculpem os editores, mas é como ver uma edição brasileira dos Cahiers do Cinéma trazer Xuxa na capa.

“Ah, mas o rock mudou”, suspiram os mais resignados. E com isso eu concordo. O rock, que era um yin-yang de Revolução e Contracultura, partiu-se em duas metades independentes. Sem o equilíbrio zen garantido pela presença da metade oposta, elas degeneraram em duas caricaturas grotescas: brutalidade sem ideologia, e sentimentalismo sem substância. O que temos hoje, de um lado, é o desnorteamento punk-metaleiro que flerta com o satanismo, o neo-nazismo, os serial-killers, o apocalipse-now de George Bush, e tudo o mais que dê a esses jovens sem causa a sensação de serem os ferrabrazes, os schwarzennegers do mundo. E do outro lado um hip-hop e um pseudo-pop que vendem a alma por pontos percentuais nas pesquisas, e dão o corpo de graça para galgar uma posição a mais nos “charts” da “Billboard”.

Pronto. Já desabafei, então vamos à revista. Que não está tão ruim, numa primeira passada, e tem artigos que confirmam com ênfase isto que acabei de dizer. Leiam a matéria que fala do rock como trilha sonora das matanças norte-americanas no Iraque. É patético ver que tudo aquilo mostrado por Coppola em Apocalipse Now continua acontecendo. O soldado sai de madrugada numa patrulha onde vai enfrentar insurgentes iraquianos; entope-se de drogas para deixar o corpo no ponto, e entope-se de rock violento para poder matar gente sem sentir medo. Foi para isto que Elvis Presley e Chuck Berry existiram? Cartas para a redação.

A Rolling Stone brasileira não poderia, é claro, ficar imune às contradições-de-rico da sua matriz californiana. O rock, como existia no começo da revista, não existe mais, ou existe empurrado para as catacumbas da Série C. Claro que os medalhões continuam desfrutando do espaço conquistado; aí estão nesse número 1 figuras dos anos 1970 como Jack Nicholson, além de Bob Dylan dando a entrevista regulamentar sobre o CD mais recente (não li ainda; já li mais de 500 entrevistas de Dylan, posso esperar). A imprensa do rock sempre teve uma tendência danada a virar press-release de gravadora.

É uma revista com a cara do rock de hoje, cheia de glam e de glitter (o que quer que isso signifique), feita naquele papel brilhoso que obriga a gente a ficar o tempo inteiro procurando um ângulo que não reflita a luz. Excelente metáfora para a própria revista e para a imprensa rock em geral. A gente fica procurando ler algo, que às vezes até está ali, mas é impossível. As luzes da ribalta e os flashes dos fotógrafos são fortes demais. Com Giselle Bundchen na capa, havemos de esperar o quê?

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