domingo, 28 de junho de 2009

1138) O time do São Cristóvão (5.11.2006)



Por que motivo o time do São Cristóvão entra em campo? É um time de quinta categoria. Não disputa nem a Série C do Brasileiro (onde o nosso Treze, aliás, marcha firme para a classificação). No próprio Campeonato Carioca, deve disputar a segunda ou terceira divisão. Quando a gente pensa nos grandes espetáculos do futebol, nas decisões de título, nos Maracanãs e Morumbis lotados, o São Cristóvão está automaticamente excluído. A pergunta é: se um time sabe que o filé-mignon-da-vida está fora do seu alcance, onde ele vai buscar motivação para calçar as chuteiras e pisar no gramado?

Primeira resposta: qualquer vitória se equivale. Ganhar um amistoso de subúrbio tem o mesmo valor simbólico de ganhar uma decisão de Copa do Mundo; a diferença é apenas quantitativa. Se você joga sua vida e seu destino num cara-ou-coroa, tanto faz se é uma moedinha de um centavo ou uma libra de ouro: cara é cara, coroa é coroa. A beleza do esporte é esse desafio de “ganhar”, que puxa de dentro de nós o máximo de nossa técnica, de nossa garra, de nosso espírito de combate e superação. (A feiúra do esporte é quando ele vira um vale-tudo onde predominam os recursos não-esportivos para conquistar vantagens não-esportivas).

Segunda resposta, que não contradiz a primeira: o esporte funciona em níveis de dificuldade cada vez maior, e precisa de “filtros de qualidade” para decidir quem está apto a ser promovido. Ronaldo Fenômeno surgiu no São Cristóvão. Passou por outros times, ficou famoso no Cruzeiro, foi para a Europa, para a Seleção... O São Cristóvão cumpriu sua função, que por ser mais obscura não é menos nobre ou menos difícil do que a do PSV ou do Barcelona. Quem foi a professora que alfabetizou Machado de Assis? Quem ensinou o primeiro dó-maior a Baden Powell? Foi preciso alguém.

Terceira resposta, que confirma e aprofunda as anteriores: existe um prazer intransferível em fazer bem alguma coisa. Joguei muita bola quando era garoto. Jogava mediocremente, e cansei de levar “driba” de garotos pobres que pronunciavam assim essa palavra, que eu sabia escrever corretamente em inglês. Mesmo assim, conheci o prazer de fazer um gol de placa, de fazer uma defesa impossível. Quando alguém pergunta o significado da Vida, ou a nossa missão no mundo, penso que a resposta está sempre diante do perguntador. A resposta é fazer direito isso que você tem para fazer. Está tomando um chope num bar? Pois o significado da vida é o direito ao prazer de um chope, e o dever de pagar por ele a quem o fez e serviu.

Nossa missão no mundo é definir o que é Certo. Dentro dele, o Necessário. Dentro do necessário, o que é Possível. Dentro deste, dar uma preferenciazinha ao que é Urgente. E esta última categoria é tão extensa que dentro dela vamos achar o Útil, o Agradável, o Lucrativo... O significado da vida é ser vivida. Como dizem os boleiros: “Pára de reclamar, rapaz, vai, joga o jogo”.

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