(ilustração: Flights of Fancy, de James Gurney)
A New York Review of Science Fiction (May 2010, # 261) publicou uma espécie de enquete feita por Barbara Bengels com alguns escritores de FC norte-americanos para avaliar que tipo de incentivo, inspiração ou iniciação eles receberam quando garotos, algo que de certa forma os encaminhou para a literatura e/ou a FC.
Bem, se eu me
perguntasse qual seria a resposta “típica” dos autores dos EUA que eu leio, que
acompanho, já li a respeito, etc., eu diria que são meninos e meninas filhos de
profissionais liberais não muito ricos, mas vivendo com conforto, e criando em
volta dos filhos uma nuvem informal de livros, músicas, desenhos, filmes,
estimulando sua imaginação; e ao mesmo tempo fazendo-o estudar sério, mesmo que
rebocando-o pela orelha.
O típico escritor de FC leu muito. Um escritor de FC é
um cara capaz de considerar a possibilidade de um dragão, de explicar reator
nuclear, de consertar um rádio, de achar uma constelação no céu e de explicar o
mito que nela se projetou.
Não tem como não admirar a singeleza cowboy com que o
veterano Jack Williamson (Legião do Espaço) conta seu estalo-de-Vieira. Com 5
ou 6 anos ele ouviu dizer que Mark Twain ganhava um dólar por palavra. Saiu
perguntando se isso valia também para palavras bem curtinhas como “to” e “the”,
e quando lhe disseram que sim ele decidiu ser escritor.
Não; cada caso é um caso. Theodore Sturgeon (More Than
Human) diz que tinha uma relação conflituosa com o padrasto, que não o deixava
ler pulp magazines. Ele guardava tudo num armário grande, e lia às escondidas.
Um dia o padrasto achou a coleção de revistas de FC e rasgou tudo. Nesse
instante, Sturgeon decidiu que tornar-se escritor de FC seria a vingança mais
completa.
Melodrama, mas a FC de Sturgeon é puro melodrama, é o desvio
da média, a exacerbação meio caricatural disto às expensas daquilo. Cada jogo
de baralho inventa sua regra, e na literatura é assim também.
Situações assim
são frequentes na vida real, mas dificilmente serão o mais mediano ou o mais
típico. Para muita gente a pulp fiction foi uma iniciação pecaminosa. Acho
legal um autor épico dizer que um dia uma revista de FC entrou na casa dos pais
dele, ele leu duas histórias que “scared the daylights out of me”, e o casal
Saberhagen proibiu o pequeno Fred (Berserker) de voltar a fazer tais
leituras.
Joanna Russ (The
Female Man) talvez seja mais mediana pelo meu critério acima. O pai era
professor de artes industriais e construiu um telescópio para ele e ela olharem
as estrelas. A mãe era professora, lia muito, e comprava antologias de FC e de
horror, que ela leu e aprendeu a gostar.
Começo mais plácido não poderia haver.
Um comentário:
E Bráulio Tavares?
Postar um comentário