Outro (Ed. Perspectiva, 2015), o novo livro de poemas de Augusto de Campos, é um dos mais visuais do autor, trazendo em cada folha dupla uma experiência de dissolução e recombinação do texto em efeitos de cores, formas, estruturas, desmontagens, paralelismos, alternâncias de imagem e função. Augusto foi um dos primeiros poetas que vi usar a antiga letra-set para compor cada poema numa fonte gráfica com letras diferentes. Agora, são efeitos visuais mais sofisticados, de textos que se entrelaçam, que giram em espiral. Tem muita gente que não gosta, mas eu acho bonita essa concretude que se dá à palavra, à letra, cravando-a com peso em cima da página. Como Paulo Leminski, que fazia fotografar e ampliar letras datilografadas até ficarem com 2 ou 3 cm de altura na página. Às vezes a fonte é tão rebuscada que ler as palavras vira uma decifração vagarosa e (im)paciente.
Muita gente aproveitou alguns efeitos do concretismo para
fazer suas próprias experiências de desmontar e remontar os Legos das palavras,
discípulos formais ou informais de Augusto, como Glauco Mattoso, André Vallias,
Paulo de Toledo, Arnaldo Antunes, Tom Zé etc. Eu faço uma poesia completamente
diferente da de Augusto de Campos mas ainda bem que isso não me impede de ver
nessa poesia um caminho possível, entre tantos outros. Um dia podemos vir a ter
uma prosa concretista no dia-a-dia, projetada em 3D à nossa volta, com blocos
de textos surgindo soltos no ar como hologramas de lojas.
Há uma subdivisão do livro apenas com efeitos de imagens,
trocadilhos ou rimas visuais comentadas. Um muito simples, mas eloquente, foi o
que mostra andando lado a lado na rua dois homens de terno preto, em duas fotos
muito conhecidas dos leitores de cada um. As fotos são emolduradas acima e
abaixo pelas palavras: “passos em lisboa / anjos em pessoa”. Isso é um poema?
Tanto faz se é poema ou não, para mim é um fragmento literário de impacto tão
simpático quanto o de um cartum ou de uma foto artística ou qualquer outra
forma pseudo-instantânea de arte.
2 comentários:
Obrigado pela resenha. Estamos ate' elaborando um trabalho novo sobre.
"Uma imagem vale por mil palavras" é a confissão dos limites da semântica. A poesia de Augusto de Campos (tive a graça de conhecê-lo pessoalmente) é a expressão do não exprimível : il miglior fabbro.
Postar um comentário