quinta-feira, 11 de setembro de 2014

3601) Guy de Maupassant (11.9.2014)



Nossa formação literária se deve muito aos livros que nos caem nas mãos por acaso, no momento certo. Quem quiser diga que o maior contista do mundo é Tchecov ou Hemingway ou qualquer outro: para mim é Guy de Maupassant, que conheci aos dez anos através da antologia Histórias Eternas (Cultrix, 1959), cheia de contos realistas, fantásticos, satíricos, românticos, tenebrosos, sentimentais, maliciosos, cruéis.  Suas histórias mais famosas são Bola de Sebo (que inspirou desde a canção “Jenny e os Piratas” de Brecht até o filme No Tempo das Diligências de John Ford), “O Horla” (uma das mais arrepiantes histórias de monstros invisíveis) e o romance Bel-Ami (sobre o jornalismo e a vida mundana de Paris).

A mãe de Maupassant era amiga de infância de Flaubert. Os dois se adoravam, e o jovem escritor foi apadrinhado com entusiasmo pelo autor de Salambô.  Com o mestre, GdM aprendeu a ser o que Jessier Quirino chama “um prestador de atenção”. Tem uma finura notável para sugerir, com poucos elementos, tipos humanos vívidos: uma rápida descrição visual, um diálogo, um adjetivo, e a pessoa está inteira e plausível diante de nós. Sua narrativa é ágil e jornalística (diferente do estilo pintura-a-óleo-em-grandes-dimensões do seu mestre). Maupassant é o mestre do parágrafo curto. Em duas ou três linhas ele tanto resume uma ação inesperada e complexa quanto o transcurso de dezenas de anos com tudo que trouxeram dentro de si.

Ficou rico publicando contos em jornais (e depois compilando-os em livros), façanha assombrosa em qualquer época. Na antologia citada, diz Ondina Ferreira no prefácio: “Foi um trabalhador infatigável: produzia num ritmo de febre. Em dez anos, espaço de tempo em que Flaubert redigia dois livros, publicou vinte e sete.”  Uma máquina-escritora comparável a Robert Silverberg, a Lester Dent, a Edgar Wallace. Certamente um autor lido e meditado por Machado de Assis, com quem só não é comparado porque tinha um temperamento diametralmente oposto.

A biografia Maupassant: A Lion in the Path (1949) de Francis Steegmuller, traz fatos curiosos como as amizades conflituosas de GdM com autores como Émile Zola, Henry James, Turgueniev. Episódios pitorescos sobre a intensa vida boêmia do autor nos bordéis de Paris e depois nas alcovas elegantes, disputado pelas mulheres devido ao seu (digamos) dom de resposta instantânea e de permanecer impávido durante horas a fio, em benefício da parceira. A sífilis que o levou à desorientação mental e ao hospício, onde morreu aos 43 anos. Foi o maior contista do seu século, e ainda é capaz de disputar em pé de igualdade com qualquer outro dos dois séculos seguintes.


2 comentários:

Carlos Almeida disse...

Fui agraciado com os textos de Maupassant a mais ou menos um ano, e o considero magistral na arte do conto breve, embora não seja meu preferido.. (que por coincidência ou não vc o cita no seu texto.. é Tchekhov.) Difícil é encontrar suas obras neh. Consegui somente duas coletâneas até agora: uma simplezinha da Martin Claret e outra portentosa da nossa tão querida e extinta Círculo do Livro. =]

Carlos Almeida disse...

Fui agraciado com os textos de Maupassant a mais ou menos um ano, e também me chegaram por acaso às mãos, sequer já tinha ouvido falar no seu nome, agora o considero magistral na arte do conto breve, embora não seja meu preferido.. (que por coincidência ou não vc o cita no seu texto.. é Tchekhov.) Consegui somente duas coletâneas até agora: uma simplezinha da Martin Claret e outra portentosa da nossa tão querida e extinta Círculo do Livro. Agora vou procurar por essa que vc indiretamente me indicou. Abraços. =]