(Charles Babbage)
Certos cientistas pertencem àquela espécie de
sujeito meticuloso, detalhista, pente-fino mental que não deixa escapar coisa
nenhuma. Deve-se a esses indivíduos
(certamente uma minoria) a fama de chatos que os cientistas têm.
Claro que não
é preciso ser cientista para ser assim. Uma vez, um amigo meu, que era técnico
de som, foi lá em casa para ouvir algo no toca-discos. No começo da música ele
começou a olhar para o relógio e anunciou que o aparelho estava com defeito. Ao
invés de 33 rotações e um terço, por minuto, que é a velocidade padrão, estava
com 33 e dois terços.
Eu perguntei: “Mas não é quase a mesma coisa?”.
Ele
estufou o peito, ofendido, e disse: “Para um leigo, sim”.
Charles Babbage, que no século 19 projetou a Máquina
Diferencial (um computador mecânico que nunca pôde ser construído) escreveu
certa vez uma carta ao poeta Lord Tennyson, a respeito do poema deste, “The
Vision of Sin”, onde se lê a frase: “Every moment dies a man, every moment one
is born” (“A todo instante um homem nasce, a todo instante um homem morre”).
Incomodado com essa inexatidão – que deixaria estável a população mundial –
Babbage sugeriu ao poeta: “Sugiro que na
próxima publicação do seu poema o verso diga: A todo instante um homem morre, a
todo instante 1 1/16 nasce”. E complementa: “O número exato é extenso demais
para caber no verso, mas acho que 1 1/16 é exato o bastante para um poema”.
É
um exemplo claro de preocupação com a perfeição do detalhe e total
desconhecimento do que se passa no conjunto.
Vi agora um comentário em The Guardian, em 2005,
sobre uma canção de Katie Melua, “Nine Million Bicycles”, que dizia: “Estamos a
12 bilhões de anos-luz da borda [do Universo] / É uma suposição. / Ninguém pode
dizer que é verdade. / Mas eu sei que estarei sempre com você”.
Simon Singh escreveu um artigo examinando
esta estrofe e declarou que não apenas o número está errado mas é muito grave
dizer que ele não passa de uma suposição (“a guess”). Diz ele que o tamanho do
universo é um número (13.7 bilhões de anos-luz) estabelecido com grande
precisão científica, e sugere que a estrofe passe a dizer:
"Estamos a 13.7 bilhões de anos-luzda borda do Universo observável.É uma boa estimativa, com margens de erro bem definidas.Os cientistas dizem que é verdade, masreconhecem que esse número pode ser melhorado.E com esta informação disponível, eu afirmoque sempre estarei com você”.
Ressalva: nem todos os cientistas são (e muitos
poetas são) pessoas fanaticamente detalhistas e preocupadas com exatidão
factual. É mais um caso de diferença de sensibilidades pessoais do que do modo
de ver de suas profissões.
3 comentários:
é muita loucura dessa galera!
e onde fica o pós-moderno?
essa galera deve odiar tal empreitada hahaha
Tá, 13,7 bilhões de anos-luz é uma boa estimativa com margens de erro bem definidas e 12 bilhões de anos-luz é uma suposição, um chute (errado, que seja, para satisfazer o Simon Singh).
Não vejo contradição :-)
Três professores do curso de Eng. Elétrica da então UFPB - Campina Grande, hoje UFCG, nos idos de oitenta e pouco, bebendo e polemizando, um "isso é como cara e coroa, cinquenta porcento! Outro: você não está levando em consideração a possibilidade de a moeda cair em pé! Uuuuuurrrrruuuuu!!!
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