A popularidade recente de livros e filmes como O Senhor dos Anéis faz parte de um renascimento da literatura de fantasia heróica no mundo inteiro, a partir dos países de língua inglesa. Aqui mesmo no Brasil pipocam a todo instante romances de autores jovens querendo reconstituir aqueles tempos épicos de grandes guerreiros e grandes batalhas.
Um crítico referiu certa vez que ao contar as aventuras dos seus hobbitts Tolkien nos transmite de modo impressionante a sensação do que significa viajar a pé. A cada capítulo seus heróis se aproximam somente um pouco mais do lugar para onde vão.
Tolkien era um escritor meticuloso, que calculava exatamente quantos quilômetros um caminhante poderia percorrer por dia, naquele terreno e naquelas condições. É muito diferente desses escritores que escrevem: “Tomada a resolução, o grupo de guerreiros pôs-se em marcha e alguns dias depois detinha-se diante do Castelo de Tremolidor. – Alto! Quem vem lá?! – bradou o sentinela”.
Dribles retóricos desse tipo dão aos livros de fantasia um quê de ficção científica e do seu uso liberal da teleportagem.
Foi talvez pensando nisto que o escritor australiano Sean McMullen, ao iniciar a pesquisa para um desses romances de fantasia heróica (ele tem um Ph.D. em literatura medieval) decidiu fazer a experiência de caminhar como um cavaleiro medieval, experiência que ele descreve em detalhe na revista inglesa Foundation (n. 96, Spring 2006).
McMullen vestiu uma roupa equivalente à de um guerreiro do século 12: botas, calças, provisões, etc. E pôs-se a caminho, com uma mochila de 30 kg às costas.
Conseguiu cobrir 30 milhas em nove horas, o que dá cerca de 48km, ou pouco mais de 5km por hora – carregando um escudo, um machado e um elmo de 8kg na cabeça. Ao fim da caminhada, ele teria que simular uma batalha, e resolveu este detalhe programando uma competição de karatê na Universidade de Melbourne, seu ponto de chegada. Eis algumas das conclusões a que ele chegou:
“Pessoas que dependem dos pés como meios de transporte são extremamente defensivas e cuidadosas a seu respeito. Caminhando, a gente tende a se concentrar no que está imediatamente à frente, em vez de vigiar possíveis emboscadas, ficando assim vulnerável a elas.
Paradas para urinar são insignificantes: parei apenas três vezes em nove horas, mesmo tomando três litros de água.
Fome é algo importante. Sem nada para pensar enquanto se caminha, a gente se lembra o tempo todo da comida que está carregando.
É possível lutar no dia seguinte após uma marcha forçada, mas não na mesma noite.
Pilhagem: se se trata de algo mais pesado do que algumas moedas de ouro, melhor esquecer.
Sexo: se a vítima for capaz de correr, provavelmente escapará.
Vandalismo: somente para coisas facilmente quebráveis.
Incêndios: uma perspectiva muito atraente depois de nove horas de marcha. Basta jogar algumas tochas, sentar-se com os pés para cima, e apreciar o espetáculo”.
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