sexta-feira, 16 de abril de 2010
1921) J. G. Ballard (1930-2009) (6.5.2009)
O trabalho tem atrapalhado minha vida de tal forma que somente no dia 1o. de maio fiquei sabendo que o escritor inglês J. G. Ballard havia morrido em 19 de abril. Sincronicidade? Dias atrás, sem saber de nada, peguei um volume dos contos de Ballard e fiquei me deliciando com suas histórias dos anos 1960. Contos de ficção científica sobre artistas que produzem, para o deleite de milionários entediados, novas formas de arte – estátuas cantantes, ou flores musicais. Histórias de catástrofes ambientais, num mundo onde tecnologia e fantástico se misturam. Uma aventura de Flash Gordon com personagens de Samuel Beckett e objetos-de-cena de Salvador Dali.
A obra de Ballard é uma das mais cruéis e premonitórias de toda a FC. É ao mesmo tempo caricatural e realista, uma versão em alto-contraste das perversões, fetichismos e indústrias-do-prazer de nossa civilização. Embora haja um conteúdo sexual nisso tudo, não é apenas de sexo que se trata, porque – por exemplo – grande parte do fetichismo de nossa Mídia Ambiente se dá através da propaganda e do consumo insaciável de novos modelos de roupas, de carros, de eletroeletrônicos, de cosméticos, de canções, de celebridades... As histórias de Ballard são pequenas fábulas mitológicas onde os deuses são substituídos por produtos industriais, o que inclui a indústria das imagens: propaganda, filmes de Hollywood, a política, as colunas sociais.
Um dos seus livros mais desconcertantes e polêmicos, The Atrocity Exhibition (1969), tem textos (seria questionável chamá-los “contos”) com títulos como “Plan for the assassination of Jacqueline Kennedy” e “Why I want to fuck Ronald Reagan”. Ballard usa esses nomes próprios, e (indiretamente) as imagens públicas que eles evocam, como alvo de pesquisas imaginárias sobre impulsos eróticos e agressivos, que tanto podem envolver o desejo sexual quanto fantasias de atentados homicidas. A vida real tem, consistentemente, confirmado suas hipóteses.
Ballard sempre foi na comunidade da FC uma presença incômoda, alguém que veio “desafinar o coro dos contentes”. A FC americana tende a ser um entretenimento adolescente, que na maturidade evolui para um otimismo tecnomilitar. Seu sonho é a colonização triunfal do Universo pela espécie humana (ou seja, os EUA). Ballard era da linha pessimista e desiludida que predomina no Reino Unido, e que vê a humanidade mais próxima de se destruir por seus próprios meios do que de transformar a Via Láctea numa extensão da Califórnia. Sua FC nunca teve o entusiasmo juvenil e a fé no futuro que vemos em Arthur C. Clarke ou Isaac Asimov. Seu mundo é freudiano e sombrio, dominado por forças que os personagens não percebem. Drogas, fetiches eletrônicos, dinheiro, perversões sexuais e impulso-de-Tânatos aparecem o tempo todo no raio-X de seus contos e romances. São fatores que parte da FC não sabe como lidar, porque contradiz seu ufanismo triunfalista em permanente lua-de-mel com a tecnologia.
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