(Émile Zola)
Será que existe mesmo esse negócio, a Fatalidade com F maiúsculo? Claro que as fatalidades minúsculas existem e acontecem todo dia, como o cara que vai botar uma carta no Correio, passa perto de uma construção, cai-lhe uma viga na cabeça e tchau. A Fatalidade é outra coisa, é algo que pertence mais ao domínio do Destino do que ao do Acaso, é algo que parecia escrito-nas-estrelas, predeterminado para acontecer. Por mais que se fuja a ela, está-se fugindo na direção de Tebas ou de Samarra, ou seja, sempre na direção desse encontro marcado com nosso futuro irreversível.
No filme Belle de Jour de Luís Buñuel há uma cena em que o casal interpretado por Jean Sorel e Catherine Deneuve vai caminhando por uma rua de Paris e vê numa calçada uma cadeira de rodas, vazia, estranhamente deixada ali. Sorel se interrompe e fica olhando para aquele objeto com um ar fascinado. A esposa o puxa pelo braço, “vamos embora, o que foi?” E ele, “nada, nada...” Ainda um pouco intrigado recomeça a andar, meio que olhando para trás. Ele próprio não sabe por que aquilo lhe chamou a atenção. Saberemos nós, no fim do filme, quando ele é alvejado pelos tiros de Pierre Clémenti e fica paralítico. Foi um vislumbre do próprio futuro; um aviso do Destino.
Num livro de Sérgio Paulo Rouanet leio um comentário sobre Émile Zola, o grande romancista do naturalismo francês da virada dos séculos 19/20. Zola era um neurótico obsessivo, que deu um certo trabalho aos psiquiatras da época. Os obsessivos são essas pessoas que lavam as mãos cem vezes por dia, ou que ao sair de casa voltam vinte vezes porque acham que deixaram alguma luz acesa ou alguma torneira aberta. Há o caso famoso de uma mulher que só saía de casa levando o ferro de passar roupa, para ter certeza de que não o deixara ligado. Diz Rouanet: “Zola precisava antes de dormir tocar várias vezes os mesmos móveis, abrir as mesmas gavetas. Contava os bicos de gás, os degraus de uma escada. De noite, abria os olhos sete vezes, para provar a si mesmo que não ia morrer” (Os Dez Amigos de Freud, vol. 2, pag. 363).
Ora – como morreu Zola? O próprio Rouanet registra (vol. 1, pag. 142) que Zola morreu em 28 de setembro de 1902, durante o sono, envenenado pelo óxido de carbono produzido pela lareira de seu apartamento. A chaminé estava entupida e o gás se acumulou no aposento. Depois suspeitou-se de um entupimento proposital; Zola arranjara muitas inimizades com sua participação no Caso Dreyfus, em que combateu com ferocidade o anti-semitismo na França. Mas à luz dessa morte, as ansiedades e obsessões anteriores parecem se justificar. Como se ele pressentisse no futuro, um perigo relacionado ao gás, à noite, à hora de ir dormir. Como se precisasse se certificar, todas as noites, movido pela angústia dos pressentimentos vagos, de que estava em segurança e que aquela coisa que temia não iria acontecer.
Será que existe mesmo esse negócio, a Fatalidade com F maiúsculo? Claro que as fatalidades minúsculas existem e acontecem todo dia, como o cara que vai botar uma carta no Correio, passa perto de uma construção, cai-lhe uma viga na cabeça e tchau. A Fatalidade é outra coisa, é algo que pertence mais ao domínio do Destino do que ao do Acaso, é algo que parecia escrito-nas-estrelas, predeterminado para acontecer. Por mais que se fuja a ela, está-se fugindo na direção de Tebas ou de Samarra, ou seja, sempre na direção desse encontro marcado com nosso futuro irreversível.
No filme Belle de Jour de Luís Buñuel há uma cena em que o casal interpretado por Jean Sorel e Catherine Deneuve vai caminhando por uma rua de Paris e vê numa calçada uma cadeira de rodas, vazia, estranhamente deixada ali. Sorel se interrompe e fica olhando para aquele objeto com um ar fascinado. A esposa o puxa pelo braço, “vamos embora, o que foi?” E ele, “nada, nada...” Ainda um pouco intrigado recomeça a andar, meio que olhando para trás. Ele próprio não sabe por que aquilo lhe chamou a atenção. Saberemos nós, no fim do filme, quando ele é alvejado pelos tiros de Pierre Clémenti e fica paralítico. Foi um vislumbre do próprio futuro; um aviso do Destino.
Num livro de Sérgio Paulo Rouanet leio um comentário sobre Émile Zola, o grande romancista do naturalismo francês da virada dos séculos 19/20. Zola era um neurótico obsessivo, que deu um certo trabalho aos psiquiatras da época. Os obsessivos são essas pessoas que lavam as mãos cem vezes por dia, ou que ao sair de casa voltam vinte vezes porque acham que deixaram alguma luz acesa ou alguma torneira aberta. Há o caso famoso de uma mulher que só saía de casa levando o ferro de passar roupa, para ter certeza de que não o deixara ligado. Diz Rouanet: “Zola precisava antes de dormir tocar várias vezes os mesmos móveis, abrir as mesmas gavetas. Contava os bicos de gás, os degraus de uma escada. De noite, abria os olhos sete vezes, para provar a si mesmo que não ia morrer” (Os Dez Amigos de Freud, vol. 2, pag. 363).
Ora – como morreu Zola? O próprio Rouanet registra (vol. 1, pag. 142) que Zola morreu em 28 de setembro de 1902, durante o sono, envenenado pelo óxido de carbono produzido pela lareira de seu apartamento. A chaminé estava entupida e o gás se acumulou no aposento. Depois suspeitou-se de um entupimento proposital; Zola arranjara muitas inimizades com sua participação no Caso Dreyfus, em que combateu com ferocidade o anti-semitismo na França. Mas à luz dessa morte, as ansiedades e obsessões anteriores parecem se justificar. Como se ele pressentisse no futuro, um perigo relacionado ao gás, à noite, à hora de ir dormir. Como se precisasse se certificar, todas as noites, movido pela angústia dos pressentimentos vagos, de que estava em segurança e que aquela coisa que temia não iria acontecer.
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