Universo: equilíbrio entre Ordem e Desordem.
Precisamos das duas. Num excesso de desordem, nada acontece. A mera formação estável de um único átomo, seja de que elemento for, requer princípios de ordem, regularidade, repetição, equilíbrio, etc.
A ordem é um estágio físico mais elevado, mais complexo, mais importante no sentido de que proporciona um número maior de combinações e de estados físicos, e chega, numa escala muito mais elevada, a dar origem à Vida. E só isto já basta para considerar que a ordem é uma boa coisa, pelo menos do ponto de vista humano.
Excesso de ordem, no entanto, pode conduzir à estagnação, à ausência de dinamismo, de crescimento. No mundo físico, um processo que se repete exatamente da mesma forma, sem alterações, sem interferências, está fadado ao insucesso: perde energia, se dissipa.
Por este motivo não existe o lendário “Moto Contínuo” ou “Moto Perpétuo”. Um processo mecânico em movimento constante se desgasta, perde energia, é incapaz de fabricar por seus próprios meios a energia necessária para manter-se em movimento.
No dia em que não existir mais o desequilíbrio energético no universo, teremos atingido o estado máximo de entropia. Tudo estará morto, frio, imóvel, mergulhado numa Ordem que é sinônimo de morte: a Morte Térmica.
O filósofo Lucrécio criou o conceito de “clinâmen” para designar certas variações imprevisíveis na trajetória dos átomos, que ele imaginava “chovendo” espaço afora em trajetórias retilíneas. Mas se essas trajetórias fossem eternamente assim, os átomos não se entrechocariam, e nada seria criado na Natureza.
O “clinâmen” é a exceção que brota de modo espontâneo e imprevisível, é um pulo-do-gato que quando acontece gera a existência do próprio gato.
O romancista Georges Perec, um conhecido construtivista capaz de planejar seus romances dentro de regras matemáticas que controlavam tudo (tema, personagens, cenários, ações, número de linhas, ordem dos capítulos, etc.) apropriou-se do conceito de clinâmen para prever rupturas ocasionais das próprias regras que estabelecia.
Excesso de ordem, assim como de desordem, é algo mortal para a arte que quer produzir uma impressão de vida. Porque a vida é isso, a alternância entre equilíbrio e desequilíbrio; solidez e fluidez; planejamento e improviso; precisão e imprecisão.
Quando estamos indo longe demais na direção de um destes extremos, precisamos de uma guinada na direção oposta. Quando tudo está ficando muito caótico, precisamos de ordem: deu-se isto quando a poesia Modernista começou a abusar da não-métrica, da não-rima, da não-estrofe, e assim por diante, e a Geração de 45 trouxe um sopro de oxigênio, recuperando e renovando conceitos de ordem formal que nos fizeram um grande bem.
E quando a poesia começa a ficar amarrada demais ao preciosismo das formas... nada como um bom cangapé nas regras, uma cambalhota nos conceitos, uma anarquização aleatória do estabelecido. Nada como um bom clinâmen.
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