Drogas e terrorismo são dois grandes temas para o cinema norte-americano de hoje. Em cartaz na Paraíba, este filme de Ridley Scott conta a ascensão e queda de um chefão do tráfico de drogas de Nova York entre os anos 1970-80. Talvez fosse mais adequado dizer: “ascensão, queda e mítico retorno”, porque figuras desse tipo, depois que são presas, condenadas e expurgadas pela justiça (ou, no linguajar pomposo da imprensa, “pagam sua dívida para com a sociedade”) costumam voltar glorificadas pelo cinema ou pela literatura. Castigado o crime, endeusa-se o criminoso que já não pode fazer o mesmo mal que fazia. Ocorre com todo mundo, desde cangaceiros até serial killers, desde terroristas até ladrões granfinos.
O Frank Lucas interpretado com solidez implacável por Denzel Washington é uma figura carismática. Sua história real foi recuperada num artigo de Mark Jacobson publicado na revista “New York” em 2000. (O artigo é brilhante, e pode ser lido aqui: http://nymag.com/nymetro/news/people/features/3649/). Jacobson passeou vários dias com o ex-gangster (saído da prisão, e agora com mais de 70 anos), revisitando as ruas em que ele criou seu império baseado em heroína importada da China e trazida clandestinamente para os EUA nos aviões que traziam os corpos de soldados americanos mortos no Vietnam. Duas grandes derrotas (o Vietnam e a droga) se juntaram num único episódio que mostra a melancólica descida do império americano rumo à sua morte anunciada.
Frank Lucas é simpático porque é bom filho, bom irmão, bom patrão e bom esposo. Ele encarna os sólidos valores interioranos e puritanos da América. Por exemplo: sua quadrilha não empregava rapazes novaiorquinos, porque ele os considerava vaidosos, arrogantes, deslumbrados com a grana fácil do tráfico. Empregava gente de sua própria família, pagava bons salários, vendia heroína com o dobro da qualidade pela metade do preço. Era um capitalista exemplar no coração do capitalismo. E é sintomático do capitalismo que para ele fosse indiferente o fato de sua mercadoria estar matando gente como moscas pelas ruas do Harlem. Lucas dizia, como tantos traficantes; “Eu apenas vendo a droga, o que o pessoal faz com ela não é da minha conta”. É como o anzol dizer: “não tenho nada a ver com o peixe”. A ética do capitalismo só abarca o processo de produção e troca. Se o que se fabrica são armas ou cocaína, tanto faz.
Lucas manteve um perfil discreto durante anos, sem que a polícia entendesse quem estava passando a Máfia para trás. Foi preciso um detetive obsessivo e incorruptível (interpretado por Russel Crowe) para descobri-lo e derrubá-lo. O filme mostra estes dois indivíduos em rota de colisão, rumo a um confronto pessoal que só acontece nos últimos dez minutos. A direção de Ridley Scott é tensa, com cenas curtas que dizem o necessário e passam adiante.
O filme é longo mas tem bom ritmo, passa rápido, dá muito bem o seu recado.
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