quinta-feira, 19 de setembro de 2013

3295) Marte sem volta 2 (19.9.2013)






Alguns milhares de pessoas já se inscreveram no projeto que pretende mandar, daqui a mais uns anos, uma equipe de astronautas para Marte. Lá, eles terão como manter-se vivos, mas sabendo que jamais poderão voltar à Terra. Uma espécie de kamikazes em câmara lenta, viajando milhões de quilômetros e sabendo o tempo inteiro que a humanidade capaz de mandá-los para aquele abismo se recusaria, alegando razões de orçamento, a trazê-los de volta.

Por que vão? Vão pela aventura, em muitos casos, e eu imagino que esses caras que gostam de participar do Camel Trophy ou do Rally Paris-Dakar iria para Marte sem nem bater a pestana, pelo perigo da coisa, pela incerteza da coisa, e pela beleza da coisa. Volto à minha habitual comparação entre astronautas e navegantes: quem embarcou na viagem de Fernão de Magalhães tinha muita esperança de voltar? Alguns voltaram, é verdade, mas é diferente partir numa aventura da qual, por definição, não se volta. 

Isto não deveria nos parecer tão irremediável (ir para Marte e nunca mais poder voltar), porque muitas vezes vamos na esquina comprar o jornal e o enfarte nos talha a vida em diagonal através do peito. Nossos aventureiros marcianos vão morrer lá? Nós vamos morrer aqui, e, como dizia aquele personagem dum filme de guerra, ao recruta que lhe perguntara a diferença entre uma granada e um obus: “Se cair em cima de você, não faz diferença nenhuma.”  Pode-se imaginar que eles venham a sofrer algum acidente e morram uma morte terrível lá. Estariam 100% seguros de não morrer uma morte terrível, estando aqui?

É a situação Blade Runner. Os andróides têm um tempo de vida limitado? Nós também. Nossos astronautas estão  uma viagem sem volta? Nós também. Eu já sonhei com a possibilidade de existência de um túnel linear de portais, em forma de estações sucessivas, em sucessivos planetas capazes de abrigar os humanos da Terra. Hoje, pode ser que Marte se torne o primeiro degrau de uma expansão humana pelo sistema solar. A FC já sonhou tanto com isso que é quase moralmente imperioso testar para ver se dá certo.

Na minha opinião, o senso de verossimilhança da conquista do espaço pelo homem vem se diluindo ou esboroando a cada década que se passa. Não parece provável a “galáxia 100% humana” que Asimov imaginou. Duvido que conseguíssemos colonizar populacionalmente alguma coisa fora do nosso Sistema Solar. Mas o projeto Marte não está no diapasão das tecno-fantasias de Arthur C. Clarke, e sim no dos programas de aventuras e endurância como “Survivor”, “No Limite”, etc. É o teste supremo de coragem, a partida para a batalha de quem tem certeza absoluta de que não voltará vivo.