quinta-feira, 25 de julho de 2013

3247) Artista profissional (25.7.2013)


Duas coisas que correram estes dias nas redes sociais me chamaram a atenção. 

Uma delas dizia respeito a um divertido post (cuja leitura aconselho) no blog “Recordar, repetir e elaborar” de Camila Pavanelli (em: http://bit.ly/1amO2EZ). O título já diz tudo: “Gente de humanas que faz um monte de coisa que não dá dinheiro”, onde ela relaciona e comenta algumas dezenas ou centenas de atividades que não dão dinheiro (eu próprio me enquadro numas 35). 

O outro foi um comentário de Fábio Cabral, da loja Passadisco (Recife), sobre um rapaz que lhe anunciou que ia montar uma banda e gravar um disco em 2015.

O cara que em 2013 já determina que vai gravar um disco em 2015 (por mais que gravar discos tenha se tornado fácil ultimamente) é claramente um futuro artista profissional, ou pelo menos tem a intenção de sê-lo. Está com um cronograma de compromissos. (O primeiro deve ser: “Compor doze músicas”). Será que está botando o carro adiante dos bois? Se ele tiver talento, até que não. Sei de muita gente que preparou cronogramas assim e depois sentou e produziu obras de alta qualidade.

Acontece que isso não é o comportamento típico da “gente de humanas” citado no post de Camila. “Gente de humanas”(leia-se: que estudou Ciências Humanas, em vez de Ciências Exatas ou Ciências Médicas) já é uma expressão irônica com que o pessoal designa a minha tribo, o pessoal que estudou artes, comunicação, ciências sociais, letras, filosofia, etc. 

Eita pessoalzinho desprovido de magnetismo financeiro. Se colocarem a gente a meio metro de distância de uma moeda de 1 real, a moeda não se move um milímetro. Por outro lado, existem profissões em que o dinheiro literalmente corre atrás do sujeito.

Scott Fitzgerald já disse: “A gente não escreve porque quer dizer alguma coisa, escreve porque tem alguma coisa para dizer”. Parafraseando: a gente faz músicas, e um dia vem a necessidade de gravar um disco; mas existe gente que se compromete a fazer um disco (para ganhar dinheiro, claro) e isso o obriga a fazer músicas. A ordem desses dois fatores altera o produto. 

Gente-de-humanas pensará primeiro nos aspectos humanos das coisas que lhe passam pela cabeça, e só muito depois irá avaliar se aquilo dá dinheiro ou não. Para o artista “de humanas”, o dinheiro é consequência. 

Para certos artistas profissionais, o dinheiro é o objetivo, e a arte é uma mera obrigação tediosa.  (E eu sou um profissional, portanto a crítica que faço não é ao profissionalismo em si, mas à mentalidade que coloca o profissionalismo acima de tudo. Torna-se muitíssimo mais fácil manipular ou subornar um artista “profissional” do que um artista “de humanas”).