segunda-feira, 21 de março de 2022

4805) Dicionário Aldebarã 23 (21.3.2022)




(ilustração: Moebius)

O planeta de Aldebarã-5 tem uma civilização influenciada pelos colonizadores terrestres.  Seu vocabulário exprime as características da natureza do planeta e o seu modo de observar os fenômenos da psicologia e da cultura.  Confiram os verbetes abaixo, recolhidos, meio ao acaso, do Pequeno Dicionário Interplanetário de Bolso.
 
“Queninodis”: o súbito reencontro, ao longo do dia, com alguma coisa (um nome, uma pessoa, um lugar, um objeto) com a qual havíamos sonhado na noite anterior, e esquecêramos por completo.
 
“Mossonheims”: cargo oficial posto em prática quando ocorre um desentendimento entre duas famílias, ou dois grupos políticos; cada um deles nomeia seu mossonheim para ir dialogar com o líder do grupo oposto e trazer ao líder do seu próprio grupo as queixas e reivindicações do outro; depois de aplainado o terreno por esse processo, os dois líderes se encontram em pessoa para a mera formalização dos acordos.
 
“Dortrisse”: o intervalo noturno entre duas sessões de sono, quando, após dormir por três ou quatro horas logo ao escurecer, as pessoas acordam, e se entregam ao lazer, à conversa ou a alguma tarefa caseira leve, depois da qual dormem novamente até amanhecer o dia. 
 
“Serundy”: jogo de salão que consiste em fazer cada pessoa, depois de sentadas em roda, escolher um objeto qualquer no aposento e o segurar à vista de todos; em seguida, sorteia-se a pessoa que dará início a uma história inventada de improviso, quando mais amalucada e improvável melhor, e nessa sua invenção deverá incluir o objeto seguro por outra pessoa da sala, o qual, ao ser finalmente referido, dará ocasião a muita risada e divertimento; em seguida, passa a vez para a pessoa ao lado, que dá prosseguimento à história, às improvisações, e à referência a outro objeto em poder de mais alguém.
 
“Wanga-wanga”: bravatas ou gabolices que alguém faz meio descuidadamente, sem nenhuma intenção mais grave, mas às vezes vê aquilo tomar uma proporção inesperada, e é forçado a desmenti-las – ou pelo menos tentar desmenti-las de modo convincente, o que muitas vezes não é mais possível.
 
“Valallini”: dieta à base de flores, mel e sementes que serve para desintoxicar os noivos nos dias que antecedem o casamento, as parturientes alguns dias antes do parto, e os administradores públicos antes dos dias de votações decisivas.
 
“Andialas”: um tradicional sistema de repasses e “terceirizações” de tarefas, trabalhos, projetos, etc., mediante o qual uma pessoa, quando se desinteressa do uma tarefa da qual foi incumbido, pode transferi-la para uma segunda pessoa com certos direitos e deveres; esta pessoa pode fazer o mesmo com uma terceira, e esta com uma quarta, desde que fiquem implícitos os níveis da transferência, que são chamados “andiala-um”, “andiala-dois”, etc. Esse sistema cria uma condição de responsabilidade recíproca entre todos os participantes.
 
“Wizz-nizz”: espécie de doce ou compota feito de fruta, para o qual se prepara um creme especial feito com a casca da própria fruta, moída e transformada em uma pasta que se deixa decantar em açúcar por longo tempo; tipicamente, quando mais fresca a fruta e mais “curtido” o creme, melhor.
 
“Cavonsy”: a sensação inexplicável que temos diante de um pequeno fato do cotidiano que não entendemos ou não pudemos examinar direito; a compulsão crescente de tirar a limpo essa dúvida; a sensação ominosa de que seria melhor deixar tudo como está, porque a resposta pode nos acarretar um prejuízo maior do que o desconhecimento.
 
“Famaldy”: um presente especial que se dá a uma pessoa que completa uma idade especial, em geral redonda (60, 70, 80 anos...). Um caderno é circulado em segredo entre amigos e parentes, e cada um tem direito a uma página, não mais. E deixa ali uma frase, um verso, uma lembrança, um desenho, uma colagem... No dia da festa, o aniversariante recebe o presente coletivo.
 
“Serruvun-pep”: pequenas faixas de borracha colorida que algumas pessoas costumam pregar no teto do quarto de dormir, para que quando a luz do sol da manhã, entrando por uma fresta específica, atingir aquele ponto, indicar que está na hora de levantar.
 
“Caflant”: aquelas situações em que reencontramos uma pessoa e, a certa altura, uma fala ou uma atitude de sua parte nos mostra que não há mais entre nós tanta identificação ou cumplicidade quanto imaginávamos.