quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

4042) Ser editor (5.2.2016)



Alguém já disse que depois do Autor, a pessoa a quem a gente deve ajoelhar e agradecer por um bom livro é o Tradutor. Eu concordo, mas estendo essa condição ao Editor. Ele é o cara que numa pilha enorme de envelopes pardos achou essa história pra mim. Não leu somente ela. Leu umas cem, e das cem tirou meia dúzia, inclusive esta. Por causa dele eu acabei de ler agora, e achei sensacional.

O editor a publicou sabendo que um dia um leitor anônimo, na outra banda do mundo, acabaria lendo aquilo, entusiasmado, e talvez nem pensasse no quanto seria remota a chance de ter lido aquilo se não fosse por esse editor. 

Ele é um descobridor. Um dia, já velho, ele vai estar numa mesa cheia de camaradagem, alguém vai erguer um brinde a ele chamando-o de “descobridor de talentos”, e ele vai dizer: “Pois é, eu ainda lembro como fiquei em dúvida, puxa vida, quem é Fulano de Tal, quem é Sicrano, dirá o público, quem vai se interessar em ler? Mas fui lá e banquei!  Por que? Porque eu sabia!”. 

Nem sempre o editor sabe, ou melhor, quase nunca.  Digo isso porque do lado de quem publica a esperança é sempre a mesma: “É este aqui que vai decolar, entrar em órbita, puxar minha conta bancária lá pra cima, e me dar a iniciativa do jogo.” 

Cada livro que a gente publica a gente vê nele o maior jeitão de best-seller. Pensamos isso com tanta força que quando um belo dia um dos livros efetivamente vende, a gente chega a ver naquilo um anticlímax, uma moeda que só nos chega às mãos depois de desvalorizada.

Para criar livro alheio, precisa ter os mesmos cuidados e o mesmo carinho que tem com o livro seu. Não ouvi de um editor essa frase, ouvi-a de uma nega véia, e não era livro a palavra, era filho, e a intenção é uma só. 

O livro é a obra do editor.  O escritor forneceu apenas o texto literário, sem dúvida o mais importante de tudo, mas por isso mesmo era preciso fazer um livro à altura. O texto é de quem escreve. O livro é de quem publica.

Mesmo quando os livros encalham, mesmo que hajam se vendido somente uns cem exemplares, o editor pode pensar nesses leitores agradecidos e achar que valeu. 

E não nos custa imaginar que às vezes o único propósito de haver uma primeira edição dos poemas que um tal de “Aaron Klopstein” publicou em Dresden em 1951, é que o derradeiro exemplar desse livro seja achado num sebo de Nova York, em 2008, e desde então ele venda em poucos anos mais de dois milhões, em cinco países. 

Tudo que certos livros precisam é não desaparecer. Se não desaparecerem, sua história irá acontecer, mesmo com décadas de atraso. O editor é justamente o cara que providencia esses milagres.