terça-feira, 3 de agosto de 2010

2310) O caba bêbo (3.8.2010)



O bom do caba bêbo é que tudo é possível. Não tou dizendo que o caba bêbo consegue realizar qualquer coisa. “Fôra, fazê-lo, assaz temerário”. Mas ele acha que pode! Esta iluminação mística o assalta até no mictório do bar, quando tenta achar botões onde só existe um fechicler. Pouco importa! O bêbo sente-se potencializado mentalmente, capaz de ascender píncaros, de sobrevoar nebulosas, de correr para a marca do pênalte e fazer o gol de letra e com cavadinha, aos 48 do 2o. tempo da decisão da Copa. Direis agora: “Tresloucado amigo! Vai dormir que teu mal é sono!...” Não, não é. Engana-se quem pensa que pálpebras pesadonas são curva descendente. É que a cabeça do bêbo está passando-marcha em todo o seu poder de processamento, o uso de CPU está esbarrando no ridículo limite de 100%, ele está alçando voos, seu nome nesse momento é Zunindo Vertiginoso, ele acaba de colapsar em soluções cristalinas problemas milenares como a quadratura do círculo, o sorriso da Gioconda, a morte de Lee Oswald, o teorema de Fermat, o final de “Blow Up”, a constante de Eddington... O caba bêbo acessa vislumbres. Usa cordilheiras como trampolim. Magnifica os quarks do universo até ver neles universos tão mais complexos quanto mais cantábiles. Ninguém o subvenciona, mas ele raciocina, impertérrito, como se cada sinapse levada a cabo lhe rendesse 0,10 centavos como ocorre na TV interativa. Pensem na prodigiosa força geratriz que o Brasil está perdendo, um Itaipu de neurônios trovejando comportas - para a bruma, através da bruma, rumo ao coisíssima nenhuma!... Onde estão as autoridades competentes que não concedem ao bêbo uma Bolsa para simplesmente pensar, e só pensar? Pensam que pensar é fácil? Antes fosse! Pensar implica compromissos, implica em deixar de frequentar festas, deixar de ir a estréias e a lançamentos apenas para ficar puxando aros metálicos de cerveja, escutando aquele espirro gelado, e cumprindo o antiquíssimo ritual que já tinha lugar nos círculos de Stonehenge ou em outros oratórios místicos onde os avatares promoviam luaus esotéricos em que todo mundo tinha direito a pensar durante uma noite inteira, desde que na manhã seguinte não fizesse muita questão de lembrar do que tinha acontecido e retornasse para suas casas tirando a grama do cabelo e dizendo à família que tinha perdido o último ônibus e fora forçado a dormir num estábulo de uma fazenda cuja proprietária, lampião em punho, lhe indicara o proverbial monte de feno dos filmes de faroeste, só que junto a ele encontrava-se outro monte de feno proverbial, o dos romances-sem-capa do século 19, sobre o qual estava deitada uma aldeã com o rosto e os atributos secundários de uma atriz de Hollywood cujo nome será melhor omitir. O mundo do bêbo é assim, compatriotas: uma cebola à qual é adicionada uma nova camada a cada novo pensamento concebido, e onde tudo colapsa numa revelação sobrenatural: não são botões, idiota, é um fechicler. Zzzzzzip! Ufa.