quinta-feira, 15 de março de 2012

2818) O 39 e o 24 (15.3.2012)



Um dos cacoetes do pensamento mágico é fazer associações de idéias entre duas coisas não-relacionadas, e, a partir daí, agir como se elas fossem uma só. Vêm daí os dois grandes princípios da magia. Na magia por semelhança, coisas com formato igual ou aparência igual são a mesma coisa, por isso fazer um bonequinho de alguém e espetar-lhe agulhas vai provocar dores naquela pessoa, Na magia por contato, qualquer coisa que esteve em contato íntimo com alguém mantém esse contato mesmo depois de afastada. Simpatias amorosas, p. ex., exigem, para fazerem efeito, uma cueca, uma raspa de unha, um cacho de cabelo da pessoa.

Um princípio menor, mas interessante, é o que faz associações desse tipo com números, o que é um problema sério, porque número é um negócio danado pra reaparecer no caminho da gente. Em chinês, por exemplo, o som do número “quatro” parece com o da palavra “morte”, daí que os chineses fazem verdadeiras ginásticas para evitá-lo. Muitos prédios na China, por conta disto, não têm quarto andar – como muitos nos pragmáticos Estados Unidos não têm o 13o.

Fiquei sabendo de uma ótima que ocorre com o número 39 no Afeganistão. Numa cidade qualquer havia um cafetão cujos serviços prostitucionais eram contratados através de telefones onde sempre aparecia o número 39. O 39 ficou com péssima reputação; há movimentos para não comprar carros em cuja placa ele apareça, casas com essa numeração, etc. O número é desagradável; dá azar. Nos colégios, alunos a quem cabe esse número são vítima de ridicularização e bullying. Recentemente, um encontro político oficial teve que pular o 39 ao enumerar os comitês de discussão técnica. O líder religioso Ataula Fawzi protestou energicamente: “Se as autoridades que representam o povo afegão atuam desta maneira diante da comunidade internacional, o que se pode esperar de um taxista ou comerciante iletrado?"

Ridículo? Nem tanto, amigos. É a mesma sina do número 24 em nossa cultura, que devido ao jogo do bicho ficou associado ao veado, e este (por motivos que nunca entendi) ao homossexualismo. O tempo todo vejo gente evitando o assento 24, o quarto 24, a senha 24... Ter esse número como símbolo do homossexualismo é uma coisa arraigada em nossa mentalidade de rua. (Diga-se de passagem, só homem dá atenção a isso, nunca vi uma mulher prestar atenção nesse número.) Na minha infância, um dos momentos culminantes do rito-de-passagem do primeiro dia de aula era a primeira chamada, quando aguardávamos, com excitação crescente, a quem caberia o número maldito, e consequentemente a vaia, os impropérios, as casquinadas escarninhas, o opróbrio, o vitupério, a desmoralização.