terça-feira, 11 de agosto de 2009

1191) Os “ensembles” musicais (6.1.2007)


("América Contemporânea")

Falarei sobre dois shows que vi no VII Mercado Cultural realizado recentemente em Salvador. O primeiro, “América Contemporânea”, reuniu músicos de diferentes países: Brasil (Benjamin e João Taubkin, Siba, Ari Collares, José Miguel Wisnik), Bolívia (Álvaro Montenegro), Venezuela (Aquiles Baez), Argentina (Carlos Aguirre), Chile (Christian Galvez), Colômbia (Lucía Pullido), Peru (Luís Solar). Olhando a ficha técnica o espectador mais cético pensa logo tratar-se de uma colcha-de-retalhos de música folclórica, mas não é o caso. Nada tenho contra o folclore ou contra a estética “colcha-de-retalhos”, mas o show América Contemporânea tem multi-instrumentistas passeando por regiões rítmicas e melódicas de cair o queixo. Tem de tudo, desde jazz até repente. É o tipo de show cuja divulgação se faz em cima de seu caráter pluri-nacional, mas que talvez funcionasse mais ainda se nos fosse possível comprar ingresso, sentar na poltrona e assistir o show sem saber quem é quem, e quem é de onde, entregando-nos ao prazer da música sem adjetivos.

O mesmo não se dá com o outro show, cuja fruição é valorizada pela informação do seu contexto. Durante o espetáculo, o grupo “Imigrassons” nos informa de que ele começou a nascer no Mercado Cultural de 2005, quando músicos de diferentes países, cada qual apresentando um trabalho diferente, começaram a trocar idéias e decidiram montar um espetáculo conjunto tendo como ponto de partida o tema “Migrações”. O grupo foi formado com os espanhóis Raúl Fernandez, Silvia Perez Cruz e Oriol Roca, os argentinos Guido Ivan Martinez Quinzio e Diego Alejandro, e o italiano Giovanni di Domenico. O show tem no repertório apenas cantigas (antigas e recentes) que falam da vida de migrantes, sendo algumas em catalão, outras em espanhol; e os números são intercalados com projeções de entrevistas de espanhóis que migraram para a América e vice-versa.

A criação de grupos ou “ensembles” desse tipo, ou seja, músicos que têm trabalhos pessoais, reúnem-se para um projeto específico, e depois separam-se de novo, tem sido uma tendência interessante das últimas décadas, inclusive no mundo do rock. Na música popular sempre existiram as “canjas”, as participações especiais, os “artistas convidados” que tinham uma presença de destaque no show de algum amigo. Mais recentemente, contudo, isto tem se transformado num formato mais ambicioso do ponto de vista das idéias e da criação musical. Não se trata de um encontro fortuito, mas de um encontro programado, agendado e intenso, mesmo que com prazo fixado para se concluir. Vejo nisto um sintoma de saúde da música popular. Quebra a tirania do grupo de sucesso, e o conceito empobrecedor de “artista exclusivo”. Favorece a troca de informações e de experiências, e multiplica as audiências ao reunir pessoas de diferentes origens, cada qual com seu público já formado. É um capítulo importante numa futura história do que está acontecendo à música de hoje.

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