terça-feira, 11 de agosto de 2009

1194) O xadrez como arte (10.1.2007)



O valor simbólico do xadrez como estilização da guerra é um lugar comum. Algumas pessoas estão levando isto a um notável grau de estetização. Os artistas Debbie e Larry Kline estão colocando à venda no saite MegaChess (http://www.megachess.com/sunusualstuff.htm) um jogo de xadrez intitulado "The Game at Hand", em que as peças brancas e pretas simbolizam respectivamente a coalizão liderada pelos EUA no Iraque/Afeganistão e os terroristas islâmicos. As peças são feitas manualmente, uma a uma, o que faz com que o jogo completo, incluindo tabuleiro, caixas, etc., custe a pechincha de 4.350 dólares.

O mais interessante do jogo (que aliás não me parece muito "jogável", do ponto de vista de quem vai usá-lo para uma partida de verdade) é a concepção que os artistas dão a cada uma das peças, feitas em cerâmica. Vejamos as Brancas, em primeiro lugar. O Rei é representado por três pilhas de moedas douradas, de diferentes tamanhos, que vistas de certo ângulo parecem duas e lembram um pouco a silhueta do falecido World Trade Center. A Dama ou Rainha é uma reprodução estilizada da Estátua da Liberdade. Visto em conjunto, o casal real é simbólico e expressivo. Os Bispos brancos são representados por duas figuras religiosas: um Papa católico e um Rabino judeu, com vestes longas, bem parecidas. Os dois Cavalos são representados por um tanque e um avião-caça pilotados por dois soldados. As duas Torres são, adequadamente, representadas por duas construções bem sólidas: uma miniatura do Pentágono e outra da Casa Branca. E os oito peões, claro são pequenos soldados de metranca em punho.

E quanto às peças pretas? Aqui vem um pulo-do-gato da imaginação dos artistas. Em vez de tentar encontrar equivalentes aos personagens das peças brancas (sob a forma de minaretes, califas, aiatolás, etc.) eles criaram dezesseis peças pretas praticamente iguais entre si, silhuetas negras vestidas de burka e chamadas de "Extremistas Islâmicos". É impossível distinguir quem é rei, dama, peão, cavalo, torre, bispo... Só é possível saber quem é quem se memorizarmos, ao longo da partida, onde cada peça estava na formação inicial -- o que não é tão difícil assim, para um enxadrista experimentado. Mas é um estresse a mais. E reproduz (pelas intenções dos artistas) a sensação de incerteza permanente de quem combate terroristas.

O xadrez fabricado pelo casal Kline não tem pretensões de jogabilidade, mas de alegoria. Suas peças brancas, representando o Ocidente capitalista, são fortemente individualizadas, distinguíveis entre si, e carregadas de um valor simbólico que se percebe ao primeiro olhar. Já as peças que representam as Pretas, o Oriente misterioso ou “o Eixo do Mal” como afirma George Bush, são incógnitas. Exprimem a ameaça onipresente. Exprimem a impessoalidade de criaturas sobre cuja natureza nunca podemos ter certeza alguma. Exprimem a maior ameaça ao Ocidente: sua imensa ignorância sobre o inimigo que enfrenta.

Um comentário:

Brontops Baruq disse...

Não sou um jogador de xadrez. Aprendi as regras quando criança e quando criança jogava. Mas depois perdi a paciência de ter a paciência de derrotar alguém no jogo.

Este jogo do jeito que você me descreveu me parece uma mistura de xadrez com damas... Talvez pudesse até ser disputado deste jeito.

Alguns anos atrás, vi um tabuleiro de xadrez em 360º. Metade do tabuleiro era dividida em casas brancas e pretas e tinha formato circular e a outra metade também. Cada metade se encaixava na outra como rodas de engrenagem. Pra começar o jogo, as peças nobres se reuniam ao redor do centro de sua metade do tabuleiro.

Não sei se me fiz entender, é difícil descrever estas coisas sem uma imagem... Era como se o tabuleiro fosse esférico e as pretas ficassem no pólo sul e as brancas no pólo norte (por exemplo, sem juízo de valor...)

Abs