terça-feira, 19 de maio de 2015

3818) Orson Welles (20.5.2015)






Passei batido pelo centenário de Orson Welles, que foi comemorado no dia 6 de maio passado. Deve ser porque estou focado nos centenários de Rosil Cavalcanti e de Lourival Batista.  Mas Welles é uma esfinge sem fim no meu deserto.  A imagem é adequada, porque ele não construiu uma pirâmide, como Bergman, Chaplin ou Kubrick podem alegar ter feito, mas deixou uma criatura bizarra (sua obra) que o que perde em perfeição ganha em mistério e vida.



Minha primeira impressão dele sempre foi a de alguém ligado à FC, e à inevitável (assim nos parecia) invasão dos marcianos à Terra. Por causa do programa The War of the Worlds ficou associado à obra de H. G. Wells: ele e seu quase-xará têm inclusive um bate-papo que gravaram ao vivo numa rádio. São os dois homens que trouxeram ao mundo o conceito de invasão marciana. O britânico, uma espécie de intelectual do povo, “self-made man” bem ao gosto dos norte-americanos, pragmático, cheio de soluções para que a humanidade dê certo. E o menino prodígio dotado de vastas e divergentes leituras, ego sem limites, e ausência patológica do medo.



Cidadão Kane já foi para os críticos como o melhor filme da história. (Ultimamente, dizem, foi suplantado nessas votações por Um Corpo que Cai de Hitchcock.) Talvez por ser um filme-síntese, composto de perfeições setoriais: a fotografia, a direção de arte, o trabalho de ator, a montagem, a labiríntica e ainda obscura criação do roteiro... É um filme bom em tudo, “uma nova maneira de fazer filmes”, como Orson explicou modestamente ao quase-xará quando este lhe perguntou sobre seu novo projeto.



O Processo e F for Fake são, para mim, tão importantes e tão bons quanto Kane, descontando-se o aspecto histórico deste, claro.  Alguns anos atrás houve uma retrospectiva da obra de Welles no Centro Cultural da Justiça Federal, na Cinelândia. Foram exibidos os comerciais hilários que ele fazia, de bebida, charutos, sei lá o que. Tinha um lado bonachão e ôver, sabia ser simpático quando havia um cheque no fim do túnel. Sempre soube se virar, teve fases de xeique e fases de showman barato, mas não era um gênio inatingível como Kubrick, era um cara que vivia cercado de gente em restaurantes e clubes.


Gosto de Mr. Arkadin, trama policial vertiginosa no gênero “magnata cosmopolita e encrencadíssimo se envolve com um crime”. Tal personagem sempre parece uma fantasia de Welles sobre si mesmo, caso nadasse em dinheiro. Seus milionários lembram o Hubertus Bigend, dos livros recentes de William Gibson. Todo protagonista de Wells é um leão rampante, o que torna ainda mais notável o que ele consegue em O Processo, onde se dá o contrário.




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