segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

1601) Hierarquia e Brodagem (30.4.2008)




São dois conceitos importantes, mas que vivem às turras, não sei por que. Ou melhor, sei: porque defendem modos de ser tidos como incompatíveis. É nesse “tidos como” que quero aplicar meu bisturi, porque acho que se examinarmos bem a coisa veremos que não são tão incompatíveis assim.

A hierarquia é vertical, a brodagem é horizontal. 

Nos sistemas hierárquicos, existe uma “escada” de valores baseada em patamares sucessivos, e a autoridade se exerce de cima para baixo. Quem está num degrau manda nos degraus de baixo, e obedece aos degraus de cima. 

O exército, por exemplo: o cabo manda no soldado, o sargento manda nos dois, o tenente manda nos três, o capitão manda nos quatro e assim por diante, até o general que manda em todos. Igrejas, corporações, empresas em geral usam esse sistema de-cima-para-baixo.

Nos sistemas de brodagem, o Poder se exerce horizontalmente. Em tese, todo mundo tem os mesmos direitos, as decisões são tomadas por debate, consenso ou votação. “Brodagem” é a união dos “brothers”, dos irmãos. É o termo da gíria atual, mas os termos clássicos para esse tipo de associação têm a mesma origem: são as Irmandades ou Fraternidades, onde se pressupõe que em princípios todos são iguais. 

Os dois sistemas, no entanto, se combinam. Qualquer Irmandade tem uma diretoria, que é um pequeno sistema hierárquico utilizado para agilizar as decisões e a administração cotidiana, mas cujas decisões podem ser bloqueadas por uma assembléia geral ou algo equivalente.

Um militar me disse uma vez, quando critiquei os sistemas hierárquicos: 

“Na vida diária a gente pode se dar o luxo de passar dias inteiros discutindo uma idéia, questionando uma ordem. Mas o militar é formado para a guerra. Se fosse formado para a paz, seria um civil. Na guerra não há condições de discutir uma ordem. Quando a ordem vem de cima, é para ser cumprida. Sem hierarquia você não pode organizar uma manobra que envolve milhares de homens ao mesmo tempo”. 

E nem precisa ser uma guerra. Na evacuação de um Titanic, por exemplo, decisões graves e medidas drásticas precisam ser tomadas, e ordens obedecidas. O navio está afundando e não há tempo de convocar uma assembléia dos tripulantes para debater a melhor estratégia. Há um plano de evacuação previsto, e cabe às autoridades que estão em cima administrar sua execução – e pagar pelos erros, se não der certo.

Vi num filme de guerra um oficial dizer a outro, que vai ser submetido à Corte Marcial: “No exército, julgamos um oficial pelas suas decisões, e julgamos suas decisões pelos resultados”.  
A responsabilidade é mais concentrada do que em sistemas horizontais democráticos, como as cooperativas, em que tudo é exaustivamente discutido. A verdade é que, se uma distribuição horizontal de poder parece mais democrática, mais igualitária, o exercício vertical do poder é indispensável. Verticalização em excesso elimina a liberdade; horizontalização em excesso é sinônimo de caos.





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