sexta-feira, 10 de abril de 2015

3785) "A Hora do Lobo" (11.4.2015)



Estou coordenando, para o cineclube da Escola de Cinema Darcy Ribeiro (Rio de Janeiro) uma Mostra do Cinema Fantástico, com filmes todos os sábados às 14 horas, entrada franca. A escola fica na esquina da Rua 1º. de Março com Rua da Alfândega, pertinho do CCBB. (Amanhã, após a sessão, haverá debate comigo e com o prof. Sérgio Almeida.)

A Hora do Lobo (“Vargtimmen”, 1968) deve ter sido o primeiro filme de Bergman que eu assisti. Me marcou mais do que seus numerosos filmes sobre crises amorosas (Cenas de um Casamento, A Hora do Amor, A Paixão de Ana, etc.)  O diretor sueco pode ser considerado um diretor de filmes conjugais, mas para mim é um diretor de filmes fantásticos, ou de clima fantástico, mesmo quando não acontece nada literalmente impossível. O Rosto (“Ansiktet”, 1958) mostra um grupo de artistas ambulantes que realizam números mediúnicos e de magia. O Sétimo Selo (1957) é o famoso filme do cavaleiro medieval que joga xadrez com a Morte. Morangos Silvestres (1957) não é propriamente fantástico mas sua maneira de justapor um personagem no presente vendo uma cena do seu passado criou um estilo único de quebra temporal.

O fantástico em A Hora do Lobo tem algo de gótico, de fatalista. Neste filme, um artista (Max von Sydow) atormentado por visões ameaçadoras resolve se afastar do mundo e vai viver com a mulher (Liv Ullmann) numa ilha pouco habitada, imaginando com isto se livrar dos fantasmas que o perseguem. A convivência com as outras pessoas da ilha acaba fazendo recrudescer suas alucinações, que a esposa, solidariamente, começa a compartilhar. A aridez da ilha deserta, na fotografia em preto-e-branco de Sven Nykvist, ganha a aparência daqueles pesadelos superficialmente realistas, onde apenas os fatos são bizarros, mas as imagens são de uma nitidez dolorosa.

Neste filme há uma cena memorável pela maneira como faz sentir a passagem do tempo. Max von Sydow, durante uma madrugada de insônia, pega o relógio e começa a marcar a passagem de um minuto.  Nunca cronometrei, mas acredito que se passe de fato um minuto, tornado concreto, sensível. E li que Bergman teria feito uma referência a uma cena de Bande à Part de Godard (1964), em que os personagens se propõem a fazer um minuto de silêncio, mas interrompem-se antes disso. Os Beatles contaram um minuto inteiro, com um desenho por segundo (e indo até o “sixty-four”) no Submarino Amarelo de George Dunning (1968).  Há muitas maneiras de fazer caber em um minuto histórias inteiras, pequenas epifanias, tragédias de bolso.  Quem sabe o personagem de Bergman sente um certo alívio quando se passa um minuto e nada acontece.




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