quarta-feira, 18 de maio de 2011

2559) “O Fantasma de Canterville” (18.5.2011)



Poucas histórias de fantasmas serão tão emblemáticas quanto esta noveleta de Oscar Wilde, de 1887, que hoje é um clássico da literatura infantil. Foi adaptada várias vezes para o cinema, várias vezes traduzida no Brasil. É a história de uma família norte-americana que compra Canterville Chase, uma tradicional propriedade rural inglesa, e ao se mudar para lá recebe o aviso de que a casa é mal-assombrada. A família é pragmática e materialista, não acredita no Fantasma, e, quando este aparece, não lhe dá muita importância. A partir dessa primeira aparição o Fantasma passa a ser o ponto de vista narrativo, e vemos sua decepção e perplexidade diante daquelas pessoas que não o temem, e daquelas crianças capazes de qualquer coisa para infernizar sua vida: há um par de gêmeos que lembram Hans & Fritz, os “Sobrinhos do Capitão” dos quadrinhos.

Wilde cria uma historieta divertida mostrando o desespero do pobre Fantasma que não assusta ninguém. Os jovens e saudáveis norte-americanos não o levam a sério em momento algum, por mais que ele recorra a todos os seus truques, caracterizações, efeitos especiais. O autor fica numa posição “triangular”, mostrando à distância os dois lados da história, satirizando ambos, mas com um bom humor juvenil que talvez tenha se diluído à medida que ele foi cristalizando a “persona” cínica que o tornou famoso em Londres.

O livro de Wilde foi mais um golpe pesado na literatura gótica de velhos castelos, noites tempestuosas, maldições seculares, tragédias de famílias nobres, espectros penitentes que imploram perdão ou vingança. Surgindo no século 18, cem anos depois esse tipo de romance já merecia sátiras e paródias variadas. No século 20, os fantasmas bonzinhos acabaram se transformando num clichê tão consagrado quanto os fantasmas ameaçadores. A “sacada” de Wilde foi de que seria engraçada uma situação em que as pessoas incrédulas vissem, sim, o fantasma, mas isso não tivesse o menor efeito sobre elas. Pelo contrário: os adultos tentam ajudá-lo (dão-lhe óleo para lubrificar as correntes, que rangem muito) e as crianças pregam-lhe peças terríveis. No fim do livro, a filha da família Otis, Virginia, torna-se amiga do fantasma e ajuda a libertar sua alma.

O fantasma do livro é Sir Simon de Canterville, que em 1565 assassinou a própria esposa. O que acaba parecendo uma premonição do poema mais famoso de Wilde, a “Balada do Cárcere de Reading”, escrito dez anos depois, em 1897, onde estão os famosos versos: “Pois todo homem mata a coisa que ama, / e cada um que escute bem: / alguns o fazem com um olhar amargo / outros com uma palavra de elogio / o covarde o faz com um beijo / e o homem valente com uma espada”. Por ter morto a esposa, Sir Simon tem que passar 300 anos vagando pelos corredores da mansão, até ser desmoralizado pela incredulidade dos norte-americanos e ser libertado pela compaixão da garota, a primeira que é capaz de perdoá-lo.

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