domingo, 14 de março de 2010

1790) O romance em blocos (4.12.2008)



(Robert Heinlein)

Podemos dividir qualquer narrativa em prosa em pedaços, blocos de informação que vão se sucedendo ao longo da leitura. Em dramaturgia de cinema e TV chama-se a isto “escaleta”: a descrição breve do que acontece, sem descer a detalhes. Poder imaginar uma seqüência inteira de ação ajuda muito a quem está escrevendo. “Fulano chega no escritório de manhã e encontra tudo revirado. A polícia examina tudo e não acha pistas. Fulano almoça com Sicrano e este lhe diz que com ele ocorreu o mesmo. Fulano abre o carro na garagem do restaurante e é atacado por trás. Fulano acorda no hospital com a esposa na beira da cama dizendo que assaltaram a casa deles.”

Cada unidade destas é completa em si e pode ser escrita independentemente. Andei lendo uma entrevista de John Barnes, escritor de FC cujas obras nunca li, mas tem romances com belos títulos, como A million open doors (1992) e The sky so big and black (2002). Barnes diz que quando estava se preparando para escrever uma série de romances juvenis, pegou os romances escritos por Robert Heinlein para leitores juvenis e descobriu neles um padrão. “A cada 25 mil palavras,” diz ele, “Heinlein colocava seu herói numa situação tal que a única conclusão seria dizer: E então ele morreu”. E nesse ponto crucial acontecia uma reviravolta completa na narrativa, que Barnes chama brincando de “um momento A Vida De Brian”, referindo-se à cena, nesse filme do Monty Python, em que o personagem cai de uma torre e só não morre porque é abduzido, durante a queda, por um disco-voador.

Barnes prossegue: “Se você é um garoto esperto, que lê rápido, 25 mil palavras correspondem mais ou menos a três horas de leitura ininterrupta, de modo que esse momento de reviravolta coincide mais ou menos com alguma interrupção, porque a mãe do leitor o chamou para jantar ou porque o pai lhe disse para ir cortar a grama”. Barnes colocou essa estrutura em prática, mas a resposta não foi bem a que esperava. “Recebi muitos emails de leitores de 40 anos,” diz ele, “mas ao que parece este tipo de ritmo estrutural continua a funcionar com eles, mas não funciona com os garotos de agora”.

Isto é algo interessante, porque 25 mil palavras é uma boa quantidade de texto. Em 1947, A. E. Van Vogt deu uma receita estrutural parecida, num artigo intitulado “Complication in the Science Fiction story”. Van Vogt se referia a contos, não a romances, e dizia que concebia seus enredos em unidades de até 800 palavras, e quando ia chegando nesse limite ele dava uma reviravolta completa, que obrigava o leitor a continuar lendo. Talvez seja este o tipo de ritmo que os leitores de hoje esperam de uma narrativa. Não é muito longo. Qualquer um destes meus artigos, por exemplo, tem sempre em torno de 450 a 500 palavras. O dobro disto é extensão suficiente para situar e desenvolver uma situação, e, chegando ao limite, “virar uma esquina” inesperada. É a velha técnica do romance-folhetim e a técnica atual da telenovela.

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