sábado, 25 de abril de 2015

3797) "Haxan, a feitiçaria" (25.4.2015)



Estou coordenando, para a Escola de Cinema Darcy Ribeiro (Rio de Janeiro) uma Mostra do Cinema Fantástico, com filmes todos os sábados às 14 horas, entrada franca. A escola fica na esquina da Rua 1º. de Março com Rua da Alfândega, pertinho do CCBB. (Após a sessão, haverá debate com o prof. Sérgio Almeida.)

Hoje será exibido Haxan – a Feitiçaria Através dos Tempos de Benjamin Christensen. Realizado em 1922, é uma co-produção dinamarquesa-sueca inspirada no famoso livro O Martelo das Feiticeiras (“Malleus Maleficarum”), o guia dos interrogadores de bruxas do século 15. Foi o filme escandinavo mais caro de sua época. O diretor pesquisou uma imensa iconografia relacionada a deuses, demônios, bruxas, duendes, criaturas monstruosas, espíritos malignos, e muitos episódios foram encenados com atores.

Haxan não é um filme de ficção nem é um documentário tradicional. Sua pesquisa tem um perfil até didático (é engraçado ver hoje a “vareta do professor” indicando os detalhes das imagens mencionados no texto). As tentativas de dramatização de situações não chegam a ganhar um caráter ficcional, são como ilustrações animadas. Xilogravuras, iluminuras, desenhos: o diretor reuniu uma impressionante quantidade de material.

Há uma corrente importante do fantástico literário (e cinematográfico) que nasce desse caldo espesso de milhares de anos de superstições, animismo, violência, preconceitos, alucinações coletivas.  A escritora Kathryn Cramer disse certa vez que “o Fantástico é a linguagem da mente submetida a extrema tensão”. É o transbordamento do inconsciente sobre o consciente, no indivíduo, e, coletivamente, o transbordamento de milhares de anos de superstição sobre a racionalidade duramente conquistada em séculos mais recentes.  Temos hoje um verniz de ciência e pragmatismo cobrindo milênios de alucinação, fanatismo, terrores religiosos.


Haxan reproduz os aspectos mais sombrios desse mundo em que seres humanos, diabos, animais e deuses se transformavam uns nos outros mediante uma fórmula mágica, uma poção, um ritual. É o mundo das feiticeiras de Salem e do Macbeth de Shakespeare, do Inferno de Dante e de Anne Rice. Estamos longe do fantástico sofisticado, na linha de Jorge Luís Borges, em que se discutem aspectos e paradoxos do espaço e do tempo. Haxan é uma viagem ao interior da mente humana e aos pesadelos que ela guarda nos seus porões. Não são os paradoxos delicados e inquietantes de René Magritte ou de Salvador Dali: é o mundo de Hieronymus Bosch, repleto de duendes, demônios, seres híbridos de animal e gente. As criaturas que abrem os olhos quando apagamos a luz. 



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