terça-feira, 25 de janeiro de 2011

2462) “A Rede Social” (25.1.2011)



O filme de David Fincher sobre a invenção do Facebook parece plausível (não li o livro original nem sei os detalhes da história). Ele deixa claro o lado meio aleatório da coisa: o sucesso involuntário, o processo que foge ao controle de seus criadores. O Facebook deixou de ser um passatempo para tirar nerds da obscuridade social em que viviam e se transformou numa fortuna de bilhões de dólares. O livro em que o filme se baseia chama Mark Zuckerberg e Eduardo Saverin de Bilionários por Acidente. Longe de ser um hino à iniciativa individual ou à genialidade, este episódio é um hino ao Acaso. Centenas de redes sociais de diferentes tipos são criadas por mês no mundo. Umas dão certo, outras não. Sabemos por quê deram ou não deram, mas só o sabemos retrospectivamente. Impossível prever. Saverin (no filme) desembolsa 19 mil dólares para fazer o Facebook decolar. Tem gente por aí que já desembolsou milhões, e a idéia deles não decolou ainda.

O Zuckerberg do filme é um nerd radical, inteligentíssimo mas inábil no trato com seres humanos, o que fica bem claro no modo agressivo com que ele trata uma namorada na sequência inicial do filme, metralhando-a com questionamentos e sarcasmos até que ela o manda pro inferno e cai fora. Vê-se que ele é muito mais aparelhado para disputas judiciais, porque durante as sessões em que é acusado de roubar as idéias alheias ele usa essas mesmas armas de maneira exemplar, demolindo os opositores. A mesma nerdice e agressividade de Bill Gates e tantos outros.

Roger Ebert, comentando o filme, observa que existem tradicionalmente três atividades que produzem gênios infantis: matemática, música e xadrez. E sugere que a programação de computadores pode ser uma quarta área. Por que não? Esses geniozinhos têm cérebros capazes de façanhas espantosas mas tendem a ser tímidos, rudes, introvertidos, antissociais. Fala-se a propósito deles na Síndrome de Asperger, que é uma condição próxima do autismo. Zuckerberg, segundo os depoimentos, seria assim; Ebert o compara com Bobby Fischer, o neurótico campeão de xadrez.

A crítica de Peter Travers na Rolling Stone comenta a imagem de Zuckerberg, milionário, sentado sozinho numa sala escura, “com o rosto iluminado pela luz azul do monitor, e fingindo que não está sozinho”. É uma maneira bitolada de ver as coisas. Muita gente pulando carnaval também finge que não está sozinha. Os nerds estão reinventando o mundo à sua imagem e semelhança. Dizer que um computador não faz companhia é tão injusto quanto dizer o mesmo de um livro ou de uma vitrola tocando Beethoven. O Facebook pode dar uma simples ilusão de sociabilidade, mas esta não é mais ilusória, para as pessoas “que não se encaixam”, do que a sociabilidade em carne-e-osso de uma festinha no campus, uma platéia de rock ou um churrasco na laje. O filme mostra que o mundo está cada vez mais formatado pelos nerds, após séculos de ditadura dos extrovertidos.

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