Certas experiências deveriam ser evitadas na vida, porque têm o dom de nos projetar nos mais profundos abismos de depressão e desespero, e de nos fazer experimentar uma sensação da absoluta derrota deste projeto chamado “Ser Humano”. Não me refiro aos campos de concentração, aos massacres étnicos, ou à miséria de algumas nações africanas. Refiro-me a um dos programas mais engraçados da TV a cabo brasileira, exibido pelo Canal Multishow da GloboSat e retransmitido pela Net. Intitula-se “Nem Big nem Brother”.
O programa exibe as fitas enviadas pelos milhões de brasileiros anônimos que sonham em ser admitidos na “Casa” para concorrer ao prêmio. Assisti-las me provoca ataques incontroláveis de riso, seguidos por acessos de profunda depressão. Nunca pensei que o ser humano pudesse ser tão patético, desajeitado, grotesco, desinformado, tão destituído de auto-crítica, tão sem desconfiômetro e simancol, tão (para usar um termo em voga entre os jovens) “sem noção”.
As pessoas classificadas para esse programa são um corte tragicômico da juventude brasileira no que tem de mais deprimente: meia dúzia de sujeitos musculosos e arrogantes, meia dúzia de peruas fofoqueiras fazendo caras-e-bocas. Aqui e acolá um “tipo excêntrico” para dar a entender que há variedade de escolha: uma moça gordinha, um gay, um matuto, etc. Pois imaginem como devem ser as pessoas que tentam se classificar para esse troço... e não conseguem.
Ver essas fitas é ter uma idéia do imenso mal que a televisão faz a este país (e antes que me critiquem, sou um dos primeiros a reconhecer que ela também faz um imenso bem). Todo mundo inicia suas apresentações dizendo “quero que vocês conheçam um pouco de mim...”, e passam a imitar os trejeitos e os clichês das pessoas que vêem na TV. Vestem coisas inomináveis e acham que estão arrasando. Dizem absurdos de arrepiar os cabelos, num esforço vão de parecerem sofisticados ou inteligentes. Pagam micos históricos quando tentam exibir seus dotes de ator, de cantor, de humorista. Provavelmente a equipe que faz a seleção é obrigada a assistir milhões de fitas dessa natureza, e acaba sendo tomada por uma tal repulsa que a única vingança possível é criar um programa e mostrar a todo mundo o quanto essas pessoas são ingênuas e risíveis.
“Já me inscrevi 6 vezes, mas eu sou brasileiro e não desisto nunca!” – é um dos bordões mais freqüentes. Há quem fique diante da câmara rezando para os santos de sua devoção, pedindo para ganhar o prêmio. Há quem vista biquíni e role na grama. Há quem fale do acidente que sofreu e das cirurgias por que passou. Há quem se vista de bichinho de pelúcia. Há quem tente tocar um instrumento, sem conseguir. Há quem praticamente se ofereça para um “programa”, faltando apenas combinar o preço. Não, amigos. Eu preferiria não ver, não saber que essa auto-exploração existe. Mas é tão engraçado que eu não resisto. Me serve de parâmetro pra quando eu estiver muito metido a esperto.
2 comentários:
Prezado Bráulio,
o famigerado Big Brother pode ser até inspiração para o cordel, por isso não resisti e escrevi um folheto sobre o tema, ressuscitando o gênero "Desmantelo", que estava meio em baixa na literatura popular nordestina. E parafraseando um dos maiores clássicos, A Chegada de Lampião no Inferno, com um pouco de teologia de almanaque. Se você quiser dar uma olhada, esse é o elo. http://marcohaurelio.blogspot.com/2009/02/chegada-do-diabo-no-big-brother.html
Abraço,
Marco Haurélio
Eu acho a televisão uma maravilha, principalmente porque, ao contrario das pessoas, pode-se desligá-la. E este programa, assim como o que o inspirou são sim, uma tragicomédia. Mas eu não consigo rir. Em geral, me enfureço, ou me deprimo.
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