Já li uns quinze livros de Isaac Asimov, traduzi dois, e se contar a quantidade de artigos científicos dele que já li em revistas dá mais uma meia-dúzia de volumes. O filme Eu, Robô de Alex Prohyas, atualmente em cartaz, tem muitas qualidades e muitos defeitos, mas pouca coisa nele tem a ver com a obra literária que o inspirou. É um mau filme? Não propriamente, se considerarmos que tem coisa muito pior passando por aí. É, no entanto, um filme caro, e como todo filme norte-americano caro é um filme que não arrisca nada. Tem que ter o pacote habitual: efeitos especiais, perseguições de automóveis (se não tiver isso, não é filme-de-ação americano), brigas espantosamente ruidosas, e uma trilha sonora que nos agarra pelos cabelos e esfrega em nossa cara a emoção que devemos sentir.
Tem que ter um roteiro com um crime misterioso cuja solução nunca fica muito bem explicada porque a explicação se concentra em meio minuto de diálogo, nas cenas finais, entre uma briga e outra. Tem que ter um suspense com um personagem pendurado sobre um abismo, esperneando. Tem que ter outro suspense com um objeto que precisa ser levado de um lugar para outro e chegar lá no segundo exato, ou tudo vai dar errado (e sempre chega, no derradeiro instante).
O que me leva a imaginar que esses filmes são feitos para serem visto por um tipo muito especial de robôs: os espectadores de filmes norte-americanos de ação. Esses indivíduos foram educados vendo tais filmes, e voltam ao cinema, repetidas vezes, para verem filmes diferentes que fazem coisas semelhantes. A mesma perseguição, milhares de vezes repetidas. O mesmo suspense, milhares de vezes esticado até o máximo. A mesma briga, milhares de vezes coreografada e treinada por profissionais que não fazem outra coisa, e pressionam roteiristas a incluírem pelo menos uma cena de briga, para que eles possam ganhar decentemente o leite das crianças.
O problema com o cinema industrial não é propriamente o tipo de filme que produz – eu gosto desses filmes, juro, me divirto bastante. Acho-os equivalentes à “pulp fiction” dos anos 1930-40, com aquelas histórias de aventuras mirabolantes, de peripécias improváveis, de monstros e vilões inverossímeis. (Aqui no Rio já está passando o trailer de Alien versus Predador, que vem logo depois de Jason contra Freddy Kruger. Coalizões desse tipo são o último prego no caixão de um gênero.) O problema com essas coisas são as centenas de milhões de dólares em jogo a cada filme. Para não terem prejuízo eles precisam nos massacrar com uma publicidade maciça, uma distribuição predatória, contratos leoninos de exibição, jabás indescritíveis para a imprensa. O problema não é serem filmes bobos, porque a “pulp fiction” também era feita de histórias bobas. Serem bobos é o lado simpático deles. O problema é serem caros, ambiciosos, e acima de tudo são reiterativos: um gênero que a cada ano que passa vai se tornando a pornografia-de-si-mesmo.
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