domingo, 7 de junho de 2015

3834) A frase de Groucho (7.6.2015)



Groucho Marx foi um dos mais inteligentes e imprevisíveis cômicos do cinema norte-americano. Também do rádio, do teatro, e da TV, mas tudo que vi dele foi no cinema, em filmes absurdistas como Uma noite na Ópera, Uma noite em Casablanca, Animal Crackers, Duck Soup e vários outros. Os Irmãos Marx eram um grupo anárquico: Chico, o espertalhão; Harpo, o mudinho que transformava em qualquer coisa qualquer objeto que houvesse no cenário; e Groucho, o trocadilhista, insultador de senhoras e figurões, aprontador de pequenos esquetes improvisados.  Um filme dos irmãos Marx é uma comédia romântica, ou aventura policial, ou outro gênero, desde que os irmãos (Groucho principalmente) não estejam na cena. No momento em que eles aparecem, subvertem o gênero. Fica o filme querendo ir numa direção e os Marx empurrando-o na direção da bagunça surrealista e irreverente.

Groucho tem um dito famoso: “Jamais entrarei para um clube capaz de me aceitar como sócio”.  É uma das suas frases paradoxais, muito citada; diz-se que ele a enviou num telegrama para um clube de Beverly Hills que o convidou para se associar.  Como se dá com os grandes paradoxos de Oscar Wilde ou de G. K. Chesterton, é uma frase que faz sentido imediato quando a lemos, apesar da aparente contradição.

Dei uma pesquisada a respeito dela, para saber a data, por causa de um conto de Monteiro Lobato que reli por acaso. O conto é “Um homem de consciência”, em Cidades Mortas (1909), a história de João Teodoro, um homem pacato e meio decepcionado com a decadência de sua cidadezinha, Itaoca. Certo dia ele é nomeado delegado, bota os baús em cima de um burro e vai embora, dizendo: “Terra em que João Teodoro chega a delegado eu não moro”.  É a mesma lógica grouchiana, sendo que em 1919 o Marx bigodudo (então com 29 anos) mal estava iniciando sua carreira artística.

Mexe aqui, mexe acolá, encontrei a referência de que John Galsworthy (Prêmio Nobel de Literatura em 1932) teria dito sobre um personagem, na Parte I de The Forsyte Saga: “Ele tinha um desprezo natural por um clube capaz de aceitá-lo como sócio”. É a mesma idéia.  A obra de Galsworthy pode ter influenciado independentemente tanto Groucho quanto o americanófilo Lobato, pois é um famoso conjunto de romances publicados entre 1906 e 1922 (em 1921 já havia uma tradução brasileira, da Ed. José Olympio). Não é absurdo supor que essa frase, curta porém marcante, tenha se grudado na memória do comediante de Hollywood e do autor do “Picapau Amarelo”. Ou – o que é igualmente provável – que este seja um sentimento intuitivo, presente em todos os que sabem o que é não pertencer às classes “diferenciadas”.

Um comentário:

Joaquim Dantas disse...

Braulio Tavares Na verdade, o clube em questão era, em princípio e no princípio antissemita. Groucho, por sua vez, era judeu, e, como, tal inaceitável como candidato a sócio. Pois bem, sabendo disso, Groucho fez uma sútil campanha "diabólica", movendo céus e terras, influências e amizades mil para ser convidado, pois era de regra que o candidato a sócio tinha que ser "convidado" por carta da direcção a integrar o quadro social. Muito bem. A campanha foi bem sucedida. Groucho recebeu a carta-convite. Para astutamente humilhar os racistas, respondeu-lhes também por escrito que "não entrava em clubes que aceitavam pessoas como ele como sócios" ... Está tudo em "A cidade das redes", sobre a Holliwood, do auge (basicamente 1930-1950), de Otto Friedrich. Excelente livro sob qualquer ponto de vista.