sexta-feira, 28 de maio de 2010

2083) Nossos avatares (11.11.2009)



(Thomas Frey)

Os autores de FC e os jornalistas especulativos costumam se indagar até onde irá nossa capacidade de criar avatares de nós mesmos. Réplicas eletrônicas capazes de reconstituir nossa personalidade e de nos representar em público. Eu sou um conservador nato e não creio que será possível produzir um sósia holográfico de mim mesmo capaz de me substituir em tarefas como fazer o supermercado ou cortar o cabelo. Pra mim, o mundo feito de matéria só pode ser acessado por quem é de matéria, e ponto final. Mas admito que a expansão dos avatares ocasionará também (num processo cumulativo de causa e efeito) a expansão de um mundo em que esses avatares possam atuar.

Um dos otimistas é Thomas Frey, que num artigo online em http://www.futuristspeaker.com/2009/05/the-future-of-the-avatar/, intitulado “O Futuro do Avatar”, sugere: “Assim que um avatar passar pela metamorfose radical de uma imagem vista na tela para um ser tridimensional que nos acompanha no jantar, conduz conversações com nossos amigos e pode nos substituir numa reunião, começará o trabalho para produzir um avatar ainda mais realista, um que poderemos tocar fisicamente”. Creio que seja possível a projeção holográfica (como nos livros de William Gibson) de uma pessoa virtual, luminosa, semitransparente, capaz de aparecer (graças a projetores) andando entre os transeuntes de uma calçada, entrando num restaurante, sentando-se à mesa, ouvindo (porque microfones próximos captam as frases e as retransmitem para a “Central”) as perguntas que as pessoas de carne e osso lhe fazem, e respondendo-as (através de um software verbal, e de pequenos altofalantes estrategicamente colocados). Isso deve dar um trabalhão danado para realizar, e vai requerer alguns bilhões de terabytes (“uma Antártida de informação”, diz Gibson).

Não creio na possibilidade de um avatar informático capaz de apanhar e levar consigo uma folha de papel, girar a maçaneta de uma porta real, guardar uma moeda no bolso... O que podemos é produzir um andróide de carne-e-osso sintéticos, em cujo cérebro há um HD de alguns petabytes de memória recebendo em tempo real tudo que se passa em nossa mente. Desse modo, eu posso estar na minha casa, no Rio, descansando em meu quarto, enquanto meu avatar caminha pelas ruas de Campina Grande, cumprimenta pessoas, entra no sebo Cata-Livros para conversar miolo-de-pote com Ronaldo e pagar pelos livros com dinheiro virtual.

Qual a utilidade de avatares assim? Mandá-los à guerra para morrer em nosso lugar? Parece a piada do português que um dia estava sentado à beira da via férrea, distraiu-se, e o trem passou por cima da perna dele. Ele juntou dinheiro, um milhão de escudos, e implantou uma perna artificial. Aí noutro dia estava sentado de novo com as duas pernas em cima do trilho quando alguém gritou: “Manuel, lá vem o trem!”. Precavido, ele deixou sobre o trilho a perna de verdade e afastou a outra, murmurando: “Esta aqui me custou foi um milhão de escudos...”

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