domingo, 3 de janeiro de 2010

1470) Escritores em ação (29.11.2007)



Imagine que alguns escritores decidissem criar um romance juntos, utilizando o ambiente e os personagens de um autor que todos eles admirassem e conhecessem bem.

Estes escritores seriam (digamos) Machado de Assis, Jorge Luís Borges, Alexandre Dumas, Italo Calvino, William Faulkner... E eles escolheriam o universo do “Dom Quixote” para criar sua história.

Cada um seria um personagem: o aventureiro Dumas seria o Quixote, o cético Faulkner seria Sancho Pança, e assim por diante. Todas as noites, eles sentariam em torno de uma mesa e, seguindo um roteiro pré-estabelecido, começariam a inventar uma continuação fictícia da grande obra de Cervantes.

Parece interessante, não é mesmo? Literatura oral, improvisada coletivamente, utilizando personagens e ambientação pré-determinados.

Nas mãos de pesos-pesados como os que citei acima, parece a receita certa para uma história interessante. Mesmo que não resultasse numa obra-prima, valeria a pena acompanhar as peripécias que essas mentes brilhantes seriam capazes de arquitetar.

Guardadas as desproporções, é exatamente isto que acontece nos chamados RPG ou Role Playing Games. Só que em vez de gênios literários são meros garotos como nossos filhos, ou meros sujeitos como nós mesmos. Não importa.

É isto que eles fazem: escolhem um Livro que contém os pontos de partida da narrativa (ambiente, situações, personagens, poderes e limitações de cada um, etc.) e começam a criar do zero uma aventura, reunindo-se algumas horas por dia.

Nunca joguei RPG mas já presenciei amigos meus jogando. É uma coisa fascinante. Alguns jogos são em universos de fantasia tipo Tolkien; outros são aventuras policiais na Londres de 1890; outros são batalhas de ficção científica em planetas distantes; outros são arrepiantes histórias de vampiros. Já existem vários com ambientação brasileira.

Os personagens se defrontam através dos seus atores, em torno de uma mesa, em que decisões são tomadas ao sabor do improviso, do momento, fazendo a história dar guinadas de surpresa. Quando um personagem resolve correr um risco, e morre, morre mesmo – cai fora do jogo e fica vendo os outros jogarem.

Algumas aventuras de RPG levam dias, semanas para ser concluídas. Dependendo do número e da disposição dos participantes e da dificuldade da missão (p. ex., atravessar um país em guerra sob disfarce, roubar um objeto e trazê-lo de volta), podem durar meses.

São uma forma de Literatura Oral na expressão da palavra. Uma Literatura Oral que não sei se foi descoberta ou imaginada por Câmara Cascudo ou Paul Zumthor. Surgiu nas metrópoles dos EUA, espalhou-se pelo mundo inteiro.

Alguns pais torcem o nariz, achando que é perda de tempo. Não, amigos. Não é perda maior de tempo do que representar peças, jogar futebol ou tocar samba. É uma atividade que pode dar a um grupo de jovens um bom pretexto para se divertir e se conhecer uns aos outros. Se vai redundar em Arte... que importância tem?




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