(Chris Burden)
A Arte Conceitual (sob os numerosos nomes que usa) nos dá às vezes a sensação de estarmos sendo enganados por um grupo de espertalhões. A gente paga uma entrada no Museu e, quando chega lá dentro, a exposição consta de algumas pilhas de tijolos e de cuecas sujas. Isto é Arte? Por outro lado, como a Arte Conceitual depende exclusivamente do que se passa na cabeça do artista, não é estatisticamente impossível que ela nos ponha de frente com experiências limite, experiências que nos fazem repensar algumas coisas, não apenas sobre pintura ou galerias, mas sobre o mundo.
Chris Burden é um artista norte-americano (nascido em 1946) que faz umas experiências pouco convencionais denominadas por ele de “danger pieces”, “peças de perigo”. Numa delas, intitulada “Doomed” (“Condenado”), Burden colocou na sala do museu um plano inclinado de vidro, e ficou por baixo dele, imóvel, tendo ao lado um relógio. O “conceito” estabelecido pelo artista era de que não se mexeria até que alguém resolvesse interferir. Isto aconteceu quarenta e cinco horas depois. Um dos guardas do Museu, penalizado, aproximou-se e colocou uma jarra com água ao lado de Burden. E a “peça” terminou nesse instante.
O interessante desta performance (ou que nome lhe queiramos dar) não é simplesmente o fato do sujeito ficar parado. Já tive notícia de dezenas de performances semelhantes. O artista fica dormindo na sala do Museu. O artista fica de pé na frente de uma tela em branco. O artista fica cortando as veias com uma faca. O artista fica explicando Arte ao ouvido de uma lebre morta. E assim por diante. Artistas que se exibem a si próprios como Arte são um lugar comum nessa atividade.
O interessante do conceito estabelecido por Burden é o fato (até certo ponto aleatório) de que a performance se encerrou com um gesto de compaixão por parte de um guarda. Guardas de Museu, de pavilhão de Bienal, etc., são uma turma que dariam um excelente material para um documentário, porque são forçados a apreciar dias a fio uma porção de objetos ou eventos num ambiente em que não poriam os pés no seu dia de folga. O guarda possivelmente comentou com os amigos algo como “esse rapaz é doido, vai acabar morrendo”, algo assim.
John Lennon conheceu Yoko Ono numa exposição desse tipo, em que ele foi convidado a subir numa longa escada, em equilíbrio precário, e pegar uma lupa para examinar algo rabiscado no teto. Com muito esforço ele pegou a lupa, e leu ali a palavra “Sim”. Lennon comentou: “Se estivesse escrito “Não’, eu teria ido embora, mas aquele ‘Sim” recompensou meu esforço”. Na performance de Burden, talvez algum espectador metido a engraçadinho tivesse se aproximado para cuspir na sua cara, ou para tirá-lo da imobilidade com um pontapé. (Aqui no Brasil, as chances disso acontecer seriam maiores) Mas o gesto de compaixão do guarda deu à obra um final impossível de prever, mas, visto em retrospecto, recompensador – e humano.
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