Clube da Luta, de David Fincher (1999) é um desses filmes polêmicos cujos críticos contra e a favor se exaltam a tal ponto que a gente vê a hora eles se transformarem em outro clube-da-luta como aquele em que Edward Norton e Brad Pitt se esmurram até transformarem a cara um do outro em postas sanguinolentas. O filme tem uma história inquietante, um roteiro extremamente tenso e energético, uma realização visual rica de efeitos. Mas eu não gosto do filme. Por quê?
Ele se divide em três partes. Na primeira, mostrando a vida de um executivo rico, “banana”, abestalhado, o filme é uma crítica ao consumismo, à passividade, à burocracia. Na segunda, quando ele fica amigo de Pitt e os dois criam um clube dedicado a brigas corporais, ocorre uma regressão ao animalismo, ao vitalismo, ao sentido zoológico da vida, ao materialismo corporal como reação à falta de sentido da vida em sociedade. Na terceira parte, eles começam a criar milícias voltadas para a violência cega, para a destruição gratuita de símbolos do Poder Econômico, como as firmas de cartões de crédito. A esta altura, o filme descambou para um homossexualismo machista sem sexo, fundado na agressividade, num sadomasoquismo militarizado e anarquista.
O primeiro terço do filme é uma excelente sátira à sociedade americana. O segundo terço é um desabafo vitalista, uma sacudida brutal que choca, impressiona, e é intelectualmente compreensível. O terceiro terço é um sintoma da desorientação dos próprios autores, que acabam mergulhando no delírio que criaram e acreditando na fantasia para-fascista com que tentaram satirizar a sociedade que renegam. Quando os cidadãos pacatos começam a participar do Clube da Luta (a respeito do qual é preciso manter segredo absoluto), sentem-se como garotos admitidos no interior de uma Sociedade Secreta onde podem dar vazão a sua agressividade, mesmo que seja ao preço de ter os dentes e o nariz partidos. Sentem-se vivos pela primeira vez. A mim, isto lembra a teoria do “Outsider” de Colin Wilson – o sujeito de inteligência superior que não consegue se adaptar a uma sociedade incapaz de compreendê-lo e de utilizar seus talentos. Para não morrer de tédio ou de depressão, ele às vezes vira um criminoso – só “para se sentir vivo de verdade”.
O filme de Fincher tem uma visão Bin Laden da política: para combater os males do capitalismo, basta explodir seus arranha-céus. É uma visão apocalíptica, destrutiva e fascista da política atual. Por ser tecnicamente muito bom, o filme inquieta, já que tudo que diz parece plausível. E o filme emperra numa situação que sempre existiu no cinema, mas parece estar existindo cada vez mais: o cara mostra aquilo tudo para criticar, ou porque gosta daquilo e quer mostrar a todo mundo? É uma discussão antiga, principalmente com filmes violentos. Fincher parece às vezes aquele fotógrafo que vai cobrir uma passeata e acaba participando dela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário