quinta-feira, 28 de agosto de 2008

0531) A máquina pensante (1.12.2004)


(do saite "Thinking Machine")

Uma das características mais interessantes do jogo de xadrez (como da maioria dos jogos, mas, concentremo-nos num só) é o fato de existir uma hierarquia estratégica que se sobrepõe à mera probabilidade matemática dos movimentos. Essa hierarquia se refere aos movimentos que deixam o jogador mais próximo de derrotar o oponente. Antes de cada movimento, existe um número gigantesco (embora finito) de possibilidades, em função do movimento de cada peça e das casas disponíveis para ela. Matematicamente, todos estes movimentos se equivalem. Estrategicamente, uns são mais relevantes do que outros.

Podemos então dizer que há três tipos de jogadas. Primeiro, a jogada possível: qualquer movimento para a frente, para trás ou para o lado, que seja permitido pelas regras, independentemente de sua utilidade. Segundo, a jogada obviamente útil: a jogada que tem mais probabilidade de ameaçar o oponente ou de conquistar para o jogador uma posição vantajosa. E terceiro, a jogada surpreendente: uma jogada pouco óbvia, que à primeira vista parece totalmente absurda, mas que pode desencadear uma combinação improvável de movimentos e dar a vitória ao jogador.

Quando um computador é programado para jogar xadrez, os movimentos do primeiro tipo são facilmente programáveis: o bispo pode ir para estas e estas casas, mas não pode ir para aquelas. Os movimentos do segundo tipo também podem ser programados, desde que se possa prever, para cada situação possível no tabuleiro, quais os caminhos mais rápidos para obter a vitória. Os movimentos de terceiro tipo são os mais difíceis. Eles são mais elegantes, mais ricos, mais surpreendentes, e possuem não apenas um valor estratégico, mas um valor estético. São o pulo-do-gato.

O saite “Thinking Machine 4” (em: http://turbulence.org/spotlight/thinking/chess.html) oferece um interessante recurso para ilustrar o modo como uma máquina pensa o xadrez. A cada jogada, linhas coloridas vão surgindo na tela indicando os movimentos mais prováveis para responder à jogada feita pelo adversário. À medida que a máquina “pensa”, algumas linhas vão ficando mais encorpadas, mais nítidas, porque um número maior de manobras passa por ali, até chegar o momento em que a máquina responde à jogada que fizemos.

Assim como no campo verbal podemos distinguir uma linguagem mais previsível e mais “pobre” (a linguagem normal do dia-a-dia) e uma linguagem menos previsível e mais “rica” (a linguagem poética), os movimentos no xadrez podem ser classificados em graus de previsibilidade e riqueza. Os melhores movimentos são os que cumprem uma função estratégica, possuem uma simplicidade estética (como a “elegância” das fórmulas matemáticas) e guardam um grau maior de imprevisibilidade. Escrevem por linhas tortas. Criam um atalho imprevisto. São inexplicáveis à primeira vista, mas na seqüência das jogadas o adversário percebe qual era a armadilha – quando já é tarde demais.

Nenhum comentário: