sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

4018) O poder do sonho (8.1.2016)



O físico John N. Bahcall disse certa vez: 

As descobertas mais importantes trazem respostas para perguntas que ainda não tínhamos condições de formular, e dizem respeito a objetos que não tínhamos como imaginar até então. 

Parece irônico, mas na Ciência a gente muitas vezes encontra a resposta antes de ter uma pergunta para ela. 

Quando Einstein propôs sua Teoria Especial da Relatividade, em 1905, faltava-lhe uma formulação matemática adequada (consta que ele não era um grande matemático; suas descobertas eram mais intuitivas do que formais). Então seu ex-professor Hermann Minkowski mostrou que esse arrazoado matemático já existia, independentemente das descobertas no campo da Física. Era, de certo modo, um raciocínio já pronto e clarificado, só que não tinha aplicação prática. 

Era uma resposta em busca de uma pergunta – que foi fornecida pela Física.

O trabalho criador do cientista (porque um cientista faz outros trabalhos que não são criadores) parece muito com o do artista; ele avança meio cegamente, guiado pela imaginação, associação de idéias, intuição, palpite, obsessão maníaca, o que for. Vai descobrindo coisas que não sabe o que são.  

Uma das melhores descrições desse impulso criador coletivo é de Nietzsche em A Gaia Ciência (1882; trad. Paulo César de Souza): 

Então vocês acham que as ciências teriam surgido e progredido, se os feiticeiros, alquimistas, astrólogos e bruxas não as tivessem precedido, como aqueles que tinham antes de criar, com suas promessas e miragens, sede, fome e gosto por potências escondidas e proibidas? Não veem que foi preciso prometer infinitamente mais do que era possível realizar, para que algo se realizasse no âmbito do conhecimento? 

 

– Talvez, da mesma forma como nos aparecem hoje os prelúdios e exercícios prévios da ciência, que não foram praticados e percebidos como tais, também a religião inteira se apresente como exercício e prelúdio para alguma época distante: ela poderá ter sido o meio singular de alguns indivíduos poderem fruir toda a autossuficiência de um deus e toda sua força de autorredenção. 

 

Sim – é lícito perguntar --, teria o ser humano aprendido, sem a escola e pré-história da religião, a sentir fome e sede de si e encontrar saciedade e plenitude em si? Foi preciso que Prometeu imaginasse antes haver roubado a luz e pagasse por isso – para finalmente descobrir que havia criado a luz, ao ansiar por ela, e que não apenas o ser humano, mas também a divindade fora obra de suas mãos e argila em suas mãos? Tudo apenas imagens do formador de imagens?  -- assim como a ilusão, o furto, o Cáucaso, o abutre e toda a trágica Prometeia dos homens do conhecimento? 




2 comentários:

Brontops Baruq disse...

Oi Bráulio,

(Será que você confere comentários em antigas postagens?)

Sobre esse assunto, você pode conferir o "Sonho de Mendeleiev", de Paul Strathern (Zahar). Ele conta a história da química desde os tempos dos alquimistas até a descoberta da tabela periódica por Mendeleiev. Mendeleiev percebeu "ligações" entre os elementos químicos, mas não conseguia organizá-los. Teve a ideia de colocar os elementos conhecidos em fichas (Deve ser coisa de russo: lembrei-me de Nabokov), mas mesmo assim... nada. Acabou cochilando e então a resposta apareceu em seu sonho.

Outro livro interessante é "Como chegamos até aqui" de Steven Johnson (também da Zahar). A ideia é contar a história do mundo através de um "robô": isso é como uma determinada tecnologia surgiu e como o mundo humano acabou se alterando a partir daí. Não esperava muita coisa, mas me fez pensar. Dentre outras coisas, ele recorre várias vezes a ideia da invenção não como fruto de um gênio individual, mas decorrente do contexto de uma época.

Abs

Braulio Tavares disse...

Todo comentário que fazem aqui em recebo um email. O problema é que leio o comentário lá na caixa de email, e pra responder teria que abrir o blog, vir até aqui. Geralmente dá preguiça. Valeram as dicas!