terça-feira, 9 de março de 2010

1767) O Presidente Negro (7.11.2008)



São 3:20 da madrugada de terça para quarta-feira (horário de verão no Rio), e acabei de ver o discurso de Barack Obama em Chicago, como presidente eleito dos Estados Unidos. Às 2 horas, a CNN já tinha proclamado o resultado, baseando-se nas projeções das pesquisas. Às 2:20 o senador republicano McCain subiu ao palanque para reconhecer publicamente a derrota, num discurso calmo, comedido e emocionado. A vitória de Obama parece ter sido aplastante (ainda não saíram os números definitivos, mas a esta altura vocês já devem saber). Senti nesta noite a emoção de ver a História acontecer diante dos meus olhos, como a senti quando o homem chegou à Lua, quando caiu o Muro de Berlim, quando um operário nordestino foi eleito presidente do Brasil.

É engraçado um sujeito tão desiludido com a política brasileira ainda marejar os olhos quando vê coisas aparentemente boas acontecerem em países distantes. Acho que a política dos EUA me emociona porque é colorida e distante como um filme, e é fácil emocionar-se com um simples filme, com uma coisa que não alcança nossa vida real. É como um jogo de futebol, cujo resultado não muda rigorosamente nada no mundo, e que por isso mesmo permite que nos entreguemos sem prudência à euforia e ao desespero. O Brasil não emociona porque sabemos como é o jogo, sabemos o quanto as cartas estão marcadas, conhecemos aqueles personagens e não conseguimos ver neles um super-herói. Mais fácil enxergá-lo em alguém que noutro país, no Olimpo dos Super-Heróis, e que no frigir dos ovos não tem carne nem osso, é apenas uma imagem eletrônica como tantas outras.

Por outro lado, a vitória de Obama me emociona porque, como todo escritor de ficção científica, eu tenho a deformação profissional de achar que o mundo é mais importante do que o meu país. Comparada a uma eleição presidencial norte-americana, que muda o perfil do mundo, a eleição de um presidente brasileiro é uma mera substituição de barnabés obscuros. Os EUA, queiramos ou não, gostemos ou não, detêm Poder. São os “senhores do baraço e do cutelo” cantados pelos poetas antigos. Nunca pensei que viveria para ver um presidente negro ser eleito dessa forma, com uma campanha limpa e equilibrada, num momento em que o país se afunda num pântano moral e definha numa hemorragia econômica.

Obama será um salvador da pátria? Duvido. Não existem salvadores. Existem funcionários escolhidos pelo povo para resolver seus problemas. O funcionário cujo mandato (ilegalmente conquistado através de fraude nas urnas) se encerra em janeiro próximo não passou de um mamulengo daquilo que existe de pior em seu país, e ajudou a precipitá-lo em guerras inúteis, mal-intencionadas e cruéis. A eleição de Obama pode reconquistar um pouco de respeito pelos EUA no resto do mundo, dependendo, é claro, das políticas que adotar, das decisões que tomar. A História está em movimento, e é emocionante ver quando a História, este paquiderme reumático, dá um passo à frente.

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