O ano de 2007 levou consigo muita gente no mundo das artes – talvez Ingmar Bergman e Michelangelo Antonioni tenham sido os nomes de maior repercussão internacional. Uma perda que me tocou de perto foi a do poeta Alberto Cunha Melo, que não sei se tenho o direito de chamar de amigo, porque nos encontramos apenas uma meia dúzia de vezes nos anos 1980, quando ele era (com Jaci Bezerra) um dos capitães das Edições Pirata, de Recife, onde publiquei meu primeiro livro de poemas em 1980. Nascido em Jaboatão em 1942, Alberto viveu a vida inteira (creio) no Recife. Era um grande admirador da poesia popular, e tenho aqui comigo seus fininhos mas preciosos livros sobre Job Patriota e Lourival Batista.
Como diz ele no poema “Alguma Pressa na Calçada”, “as pessoas se descobrem / muito tarde: / só se vêem / e se falam / (mesmo) / quando já passaram”. Mais peso do que as amizades pessoais tem, às vezes, a leitura calada e constante do que é escrito por alguém que apenas cumprimentamos à distância. Seu livro Noticiário (1979) me fez companhia em muitas viagens e mudanças, e não acho que seja pretensão de minha parte perceber sua influência sobre a dicção de numerosos textos de meu segundo livro (Sai do meio que lá vem o filósofo, 1982). Alberto fazia uma poesia madura e corajosa que olhava o Brasil como ele é. “Mas, às vezes, despertamos / para salvar / aqueles que se afogam / nas águas do nosso despertar” (“Nos Escombros da Comunidade”).
Os poemas curtos desse livro têm uma ternura e uma crueldade que lembram os melhores poemas de Brecht: “É assim que um homem / começa a sobrar na terra. / Justamente quando começa / a dispersar em suspiros / sua grande explosão” (“Neo-Romantismo à Nordestina”). São poemas que vão de cinco ou seis linhas até quinze ou vinte, sem forma fixa, mantendo um ritmo coloquial, coeso, que não exclui uma surpresa verbal a cada verso, uma imagem insólita, uma comparação dolorosa e verdadeira. Como quando ele diz (em “Operação Fênix: Relatório”) que “as crianças sempre encontram / muita coisa para brincar / depois dos bombardeios”. Ou quando, em “Aos Poetas Patriotas”, ironiza o trabalho burocrata dizendo: “estive sempre em salas / onde o tempo e as mãos / eram mais vigiados / do que o céu pelos camponeses”. Ou quando diz em “Help aos Periféricos”: “Londres pedia socorro / aos que nela buscavam / refugiar-se”.
Alberto morreu em outubro passado, de complicações surgidas após um transplante de fígado. Muito material seu pode ser encontrado em seu saite: http://www.albertocmelo.com/. Dele guardo os versos de “Oração Pelo Poema – XXVI”: ““A cem quilômetros por hora, / solto a direção do automóvel / para escrever alguma coisa / mais urgente que minha vida. / (...) Ó meu Deus, eu quero escrever / a minha vida, não teu Céu. / Eu estou só e enlouquecido / como as ovelhas mais longínquas. / Dá pelo menos a esperança / de terminar o doloroso / poema. Dá isso a teu filho, / caído, e coberto de sal”.
Como diz ele no poema “Alguma Pressa na Calçada”, “as pessoas se descobrem / muito tarde: / só se vêem / e se falam / (mesmo) / quando já passaram”. Mais peso do que as amizades pessoais tem, às vezes, a leitura calada e constante do que é escrito por alguém que apenas cumprimentamos à distância. Seu livro Noticiário (1979) me fez companhia em muitas viagens e mudanças, e não acho que seja pretensão de minha parte perceber sua influência sobre a dicção de numerosos textos de meu segundo livro (Sai do meio que lá vem o filósofo, 1982). Alberto fazia uma poesia madura e corajosa que olhava o Brasil como ele é. “Mas, às vezes, despertamos / para salvar / aqueles que se afogam / nas águas do nosso despertar” (“Nos Escombros da Comunidade”).
Os poemas curtos desse livro têm uma ternura e uma crueldade que lembram os melhores poemas de Brecht: “É assim que um homem / começa a sobrar na terra. / Justamente quando começa / a dispersar em suspiros / sua grande explosão” (“Neo-Romantismo à Nordestina”). São poemas que vão de cinco ou seis linhas até quinze ou vinte, sem forma fixa, mantendo um ritmo coloquial, coeso, que não exclui uma surpresa verbal a cada verso, uma imagem insólita, uma comparação dolorosa e verdadeira. Como quando ele diz (em “Operação Fênix: Relatório”) que “as crianças sempre encontram / muita coisa para brincar / depois dos bombardeios”. Ou quando, em “Aos Poetas Patriotas”, ironiza o trabalho burocrata dizendo: “estive sempre em salas / onde o tempo e as mãos / eram mais vigiados / do que o céu pelos camponeses”. Ou quando diz em “Help aos Periféricos”: “Londres pedia socorro / aos que nela buscavam / refugiar-se”.
Alberto morreu em outubro passado, de complicações surgidas após um transplante de fígado. Muito material seu pode ser encontrado em seu saite: http://www.albertocmelo.com/. Dele guardo os versos de “Oração Pelo Poema – XXVI”: ““A cem quilômetros por hora, / solto a direção do automóvel / para escrever alguma coisa / mais urgente que minha vida. / (...) Ó meu Deus, eu quero escrever / a minha vida, não teu Céu. / Eu estou só e enlouquecido / como as ovelhas mais longínquas. / Dá pelo menos a esperança / de terminar o doloroso / poema. Dá isso a teu filho, / caído, e coberto de sal”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário