sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

1412) A sensação do impossível (22.9.2007)




Nunca tive experiência alguma com o sobrenatural, mas nenhum indivíduo, mesmo o mais cético, pode viver a vida inteira sem experimentar a sensação do Fantástico, do Impossível. 

No prefácio ao livro O Despertar dos Mágicos, Louis Pauwels cita um episódio narrado pelo cientista Loren Eiseley. Diz ele que certo dia de neblina muito cerrada ia andando pelo campo quando surgiu de repente à sua frente um corvo voando baixo. Ao vê-lo, o corvo soltou um grito agudo de terror, e bateu asas atabalhoadamente, afastando-se. 

Eiseley logo percebeu por quê: atrapalhado pela neblina, o corvo julgava que estava voando a dezenas de metros de altura, e o que viu de repente foi (pelo seu ponto de vista) um homem caminhando pelo espaço, numa altitude que só as aves alcançam! Aterrorizou-se, e, diz Eiseley “nunca mais será como os outros corvos”.

Eu já tive uma experiência semelhante num vôo noturno do Nordeste para o Rio. Após uma escala em Salvador, dei um rápido cochilo, e quando acordei sabia que faltava mais de uma hora para chegarmos ao Galeão. De repente, olhei pela janela, onde teoricamente devia haver apenas a escuridão, e percebi uma cidade gigantesca cujas luzes, avenidas e edifícios cobriam todo o chão, de horizonte a horizonte. 

Claro – era o Rio, e meu cochilo me fizera perder a noção do tempo. Mas o surgimento daquela cidade fantasmagórica e real me produziu um espasmo de terror que não esqueço até hoje.

Já experimentei rupturas com a realidade em escala menos inquietante. Uma vez liguei a TV para ver o videoteipe de um jogo Flamengo x América que eu sabia ter terminado 0x0. Fiquei tomando café e vendo o jogo, quando de repente, o jogador do América entra de área adentro e estufa a rede. “Impedimento”, pensei. Mas nada do juiz marcar o impedimento! Os caras se abraçaram, a bola foi levada ao centro. “O bandeirinha vai interferir,” pensei. Que nada. O bandeirinha lá, na dele, e o Flamengo deu a saída, e o jogo prosseguiu. 

Claro – quem me deu a informação sobre o placar tinha errado, o jogo foi 1x0 para o América. Mas é muito incômodo para o intelecto ver um gol num jogo no qual sabemos não ter ocorrido gol algum.

Quando fui ver o filme O Feitiço de Áquila, eu sabia apenas que era a história de um cara que se transformava em lobo. O filme era com Matthew Broderick, e fiquei o tempo todo esperando que acontecesse a transformação. Lá pelas tantas, tinha uma cena com Rutger Hauer, que faz o papel de um cavaleiro. Pois não é que de repente o cara começa a se transformar em lobo?! 

Mais uma vez, tudo se originou de um erro de informação. Como eu esperava que a transformação ocorresse no outro personagem, houve uma sensação incomodamente real e impossível em ver aquilo acontecer com o personagem que eu não esperava. 

Ainda existem possibilidades de contato com o Fantástico, mesmo num mundo cartesiano e cabralino como o de alguns sujeitos.




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